Em nova onda de contaminação, redução do tempo de isolamento por covid causa dúvida

Alegação é que contágio da variante ômicron ocorre prioritariamente nos primeiros dias, mas especialistas alertam ser preciso manter cuidados

Em nova onda de contaminação, redução do tempo de isolamento por covid causa dúvida

Em nova onda de contaminação, redução do tempo de isolamento por covid causa dúvida

Alegação é que contágio da variante ômicron ocorre prioritariamente nos primeiros dias, mas especialistas alertam ser preciso manter cuidados

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Luciano Velleda

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Tempo de isolamento agora considera situação vacinal do paciente, sintomas e teste negativo. Foto: Prefeitura Municipal de Arapongas

Tempo de isolamento agora considera situação vacinal do paciente, sintomas e teste negativo. Foto: Prefeitura Municipal de Arapongas

O governo de Eduardo Leite (PSDB) anunciou nesta quarta-feira (12) novas orientações quanto ao tempo de isolamento de pessoas com covid-19. O prazo, que já foi de 14 dias e estava em 10 dias, agora pode ser reduzido para um mínimo de cinco dias, dependendo dos sintomas apresentados e da situação vacinal do paciente.

 

Para quem está com o esquema vacinal completo, o prazo será determinado após avaliação dos sintomas: cinco dias para quem não apresentar febre (ou estiver assintomática) e sete dias para quem teve febre. O prazo muda para pessoas com o diagnóstico de covid-19 e que ainda não tenham o esquema vacinal completo: para esses, o prazo de isolamento permanece em 10 dias, contados a partir do início dos sintomas.

 

A nova orientação do governo estadual ocorre dois dias após o Ministério da Saúde anunciar medidas semelhantes. A principal diferença é que o governo federal recomenda o fim do isolamento em cinco dias apenas para quem era realizar teste (RT-PCR ou teste rápido de antígeno) para covid-19 com resultado negativo no 5º dia, desde que não apresente sintomas respiratórios e febre, há pelo menos 24 horas, e sem o uso de antitérmicos.

 

Porém, se o resultado for positivo, é necessário permanecer em isolamento por 10 dias a contar do início dos sintomas. E para aqueles que no 7º dia ainda apresentem sintomas, o Ministério diz ser obrigatória a realização do teste – orientação não dada pelo governo Leite. Nesse caso, se o resultado for negativo a pessoa deverá aguardar 24 horas sem sintomas para sair do isolamento. Caso o teste dê positivo, deverá ser mantido o isolamento por pelo menos 10 dias contados a partir do início dos sintomas.

 

A origem do novo protocolo

 

Todas essas mudanças no Brasil e no RS ocorrem após o CDC (Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos) anunciar a redução do tempo de isolamento (para quem testa positivo) e de quarentena (para quem teve contato com pessoa infectada) no final de dezembro. Na ocasião, a decisão do órgão americano foi criticada por médicos e cientistas e bem-vinda por setores econômicos que sofriam com o afastamento de um grande número de funcionários contaminados.

 

Para Alexandre Zavascki, infectologista do Hospital de Clínicas de Porto Alegre e professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), houve um erro de comunicação do CDC dos Estados Unidos e de interpretação da comunidade. Ele explica que os documentos do CDC dizem que os pacientes assintomáticos no 5º dia poderiam retomar suas atividades usando máscara bem ajustada até o 10º dia.

 

“Eles mantiveram uma proteção adicional assumindo que existe uma proporção de pacientes que, a partir do quinto dia, ainda conseguem eliminar o vírus”, avalia.

 

O professor de Medicina da UFRGS diz que o tempo de cinco dias, no caso da variante ômicron, não surgiu de estudos virológicos, e sim de dados epidemiológicos iniciais com a nova variante. Esses dados indicam que os casos secundários, ou seja, as contaminações partir dos casos iniciais, ocorrem no começo da doença e não muitos dias depois. “Eles viram que a fase inicial dos primeiros cinco dias era a fase principal de transmissão da ômicron”, explica.

 

No entanto, Zavascki alerta que isso não significa dizer que não há transmissão após o 5º dia, e esse foi justamente o erro ocorrido na interpretação feita do documento do CDC. Para o infectologista, faltou ao órgão americano ter enfatizado tal ponto.

 

“Eles não disseram isso (que não pode haver contaminação depois do quinto dia), mas não enfatizaram, e todo mundo leu, médicos e muitas empresas, e entenderam errado que depois de cinco dias está ‘liberado todo mundo’”, pondera.

 

Em sua orientação, o CDC ainda declarou ser preciso avaliar se no 5º dia o paciente já estava sem sintomas, sem febre nas últimas 24h e se podia usar a máscara nos dias seguintes. Tais orientações acabaram sendo ignoradas pela comunidade médica e científica, que Zavascki diz também não ter divulgado adequadamente.

 

“Houve um grande erro de comunicação nisso tudo. Infelizmente a comunicação continua sendo um grande problema. Se ler com calma todo o documento, que não é longo, está tudo escrito ali, mas infelizmente cada vez mais se lê apenas o que interessa e têm pessoas que se aproveitam disso”, lamenta, citando que por esse motivo pessoas começaram a voltar ao trabalho antes do tempo correto e sem preencher os critérios básicos.

 

Zavascki salienta que alguns pesquisadores propunham a realização de teste rápido de antígeno no 5º dia do isolamento – medida agora orientada pelo Ministério da Saúde, mas não pelo governo gaúcho. Em caso de resultado negativo, associado com a ausência de sintomas, haveria então maior segurança de que a pessoa não estaria mais transmitindo o vírus. E, claro, seguir usando máscara.

 

“Se tiver esses três componentes realmente vai ser seguro. O maior desafio é conseguir com que as pessoas cumpram o primeiro (não ter mais sintoma). A grande pressão das pessoas que empregam, pra ter o trabalhador de volta…as vezes com sintomas não claramente resolvidos ou não ter mais as 24h sem febre. Esse é o grande desafio”, opina.

 

A nova orientação do Ministério da Saúde é bem vista pelo professor de Medicina da UFRGS. “Mesmo sem ter estudos virológicos, a partir de estudos epidemiológicos mostrando que esse é o período principal e que poucas pessoas vão transmitir depois do quinto dia, lembrando que ‘poucas’ não é ninguém, se a gente colocar o teste de antígeno haverá uma segurança maior”, conclui.

 

Sinal trocado

 

Também infectologista e mestre em Ciências Médicas, Ronaldo Hallal faz questão de enfatizar que o momento da pandemia no Brasil, com o crescimento da contaminação causado pela variante ômicron, deveria ser o de aumentar medidas de prevenção e não o contrário.

 

Embora a nova variante parece ser menos agressiva do que as anteriores, ela é mais transmissível e, ao atingir um número maior de pessoas, em escala a quantidade de vítimas doentes também aumenta, algumas com doença grave.

 

Hallal recorda que os Estados Unidos acaba de passar por uma espécie de colapso em determinadas atividades econômicas devido a ausência de trabalhadores, afastados pela covid. Houve fechamento do comércio, cancelamento de voos e falta de profissionais de saúde.

 

O infectologista considera que o impacto na economia pode ter influenciado a orientação do CDC para reduzir o tempo de isolamento, embora também concorde que os dias iniciais da doença sejam o auge do período de contágio, podendo no entanto se estender até o 10º dia.

 

“Como a ômicron é uma situação nova, não há ainda dados epidemiológicos confiáveis o suficiente para dar segurança, do ponto de vista técnico, de que a pessoa não transmitirá depois do quinto dia, mesmo que seja assintomática”, afirma. “Me parece que é uma medida mais relacionada a reduzir o tempo de afastamento das pessoas do trabalho do que por um dado produzido relacionado a ômicron.”

 

Ao mesmo tempo, Hallal pondera que algumas análises indicam que pessoas vacinadas transmitem por menos tempo a ômicron do que outras não vacinadas. Nesse sentido, o infectologista diz que a redução do tempo de isolamento faz mais sentido para quem está imunizado.

 

De qualquer forma, Hallal insiste que o atual momento da crise sanitária no País pede reforço nas medidas preventivas. A questão, diz ele, é que o Brasil nunca conseguiu, de fato, fazer testagem em massa e convencer a população a fazer quarentena. A chegada da ômicron neste momento e o rápido domínio sobre outras variantes tampouco é supresa, haja visto o que aconteceu antes na Europa e nos Estados Unidos.

 

“Acho que não seria o momento oportuno pra se reduzir quarentena, mas seria o momento oportuno pra se reforçar uma política de prevenção, com uso de máscara adequada, algo que a gente vem discutindo desde o ano passado”, destaca.

 

Embora avalia como inoportuna a redução da quarentena no contexto epidemiológico que o Brasil está vivendo, a medida não o surpreende por ser reflexo do que define como uma falta de política de proteção da vida da população. Hallal ainda demonstra preocupação com os comentários de que a ômicron é “leve”, pois isso banaliza a prevenção e sinaliza que não é mais um problema de saúde pública.

 

O infectologista diz que a tese da ômicron ser a variante que pode levar ao fim da pandemia, por ser menos virulenta e mais contagiosa, é outro debate e que só poderá ser melhor compreendido nos próximos meses ou anos.

 

As novas orientações anunciadas pelo governo gaúcho

 

Pessoa sem esquema vacinal completo

  • Isolamento domiciliar de dez dias (a contar do início dos sintomas).
  • Procurar novamente atendimento se houver febre persistente.
  • Reforçar o uso de máscaras.
  • Contactantes domiciliares assintomáticos podem manter atividades, desde que reforçados os cuidados de uso de máscara e distanciamento.

Pessoa com esquema vacinal completo e que não apresentou febre (ou assintomática)

  • Isolamento domiciliar de cinco dias.
  • Procurar atendimento se apresentar febre no quarto ou quinto dia de isolamento.
  • Reforçar o uso de máscaras, em especial por dez dias.
  • Contactantes domiciliares assintomáticos podem manter atividades, desde que reforçados os cuidados de uso de máscara e distanciamento.

Pessoa com esquema vacinal completo que apresentou febre

  • Isolamento domiciliar de sete dias (a contar do início dos sintomas).
  • Procurar atendimento se apresentar febre no sexto ou sétimo dia de isolamento.
  • Reforçar o uso de máscaras, em especial por dez dias.
  • Contactantes domiciliares assintomáticos podem manter atividades, desde que reforçados os cuidados de uso de máscara e distanciamento