Deputada baiana Olívia Santana lança Preta na política

Deputada baiana Olívia Santana lança Preta na política

Deputada baiana Olívia Santana lança Preta na política

O lançamento do livro ocorreu nesse sábado (8) durante o Festival Latinidade, que desde 5ª feira enriquece a agenda de Brasília com ricas trocas de saberes

INÍCIOEU ESTUDANTETRABALHO & FORMAÇÃO

CS

Carmem Souza

 (crédito:  Nega Cruz
)

(crédito: Nega Cruz )

O Festival Latinidades, que desde quinta-feira enriquece a agenda de Brasília com ricas trocas de saberes, foi palco do lançamento do livro Mulher Preta na Política, da baiana Olívia Santana.

A deputada estadual (PCdoB) tem uma trajetória de mais de 35 anos nas lutas sociais dentro e fora dos espaços de poder institucionalizados, sendo uma das negras pioneiras na ocupação de cargos públicos no país. Agora, compartilha toda essa experiência em sua obra de estreia. À coluna fala sobre a nova empreitada.

O que as pessoas vão encontrar no livro?

As pessoas vão encontrar o relato da minha experiência na política tanto nos movimentos sociais quanto no movimento negro e feminista, mas também na área institucional e, mais precisamente, eleitoral. Então, eu escrevo sobre os desafios que uma mulher negra enfrenta no processo eleitoral por ser mulher e por ser negra. Sobre as barreiras mais comuns que a gente enfrenta, que dizem respeito desde a nossa imagem que não é associada a uma imagem de poder, de representação de uma determinada sociedade, até a situação do network. Nos falta, muitas vezes, o network econômico, financeiro. Eu sentia muita falta de ver em uma literatura que pudesse tratar em conjunto esses desafios. Achei que seria interessante compartilhar a minha experiência que vai desde o momento que eu nasci em uma favela até o momento em que eu me coloco neste lugar de representação, em um lugar ocupado por homens brancos.

 

 Deputada estadual Olívia Santana.
Deputada estadual Olívia Santana.(foto: Deputada Olívia Santana/ASCOM)

 

Quando se chega, os desafios não acabam…

A gente enfrenta uma série de ataques de violência por ocupar um espaço que é tradicionalmente masculino, branco e rico. Mulheres negras vêm na direção diametralmente oposta. Na maioria das vezes, a gente não vem de família nem sequer de classe média, não tem uma rede de relacionamentos de influência institucional política. É diferente do que acontece com esses homens que fizeram da política um ambiente patrimonialista. Geralmente, você tem o homem que foi deputado e, quando ele vira prefeito, coloca o filho para ser deputado. Então, você vê jovens que entram na política não porque têm um trabalho de ativistas por uma determinada causa, mas porque são filhos ou netos de políticos tradicionais. Quando você vai olhar na essência, essa tal renovação da política, na verdade, se dá mantendo uma tradição familiar. Essa é uma questão que também trato no meu livro. O livro relata a minha experiência fazendo as conexões com experiências de outras mulheres negras que também chegaram à política. Eu falo de Antonieta de Barros, de Jurema Batista, de Marielle Franco. A violência política com mulheres pretas é muito mais dura. Não é somente o sexismo, é também o racismo, a desigualdade de classe, é tudo muito mesclado e dá uma situação de exclusão muito maior. Por isso que somos diminutas, digamos assim, nessas instâncias de representação. Há um funil sexista e racista que nos impede de ocupar esse lugar de representação da sociedade.

Nas últimas eleições federais, se falou muito de uma maior representatividade nas candidaturas. A senhora concorda?

Eu faço referência a esse fenômeno também, o afro-oportunismo. Com o recorte de financiamento público de campanha por gênero e raça, de repente, muitas pessoas que se declaravam brancas passaram a se declarar negras, porque se declaram pardas. Então, o pardo virou um lugar da flexão extrema. Você vai ter ali pessoas que realmente são negras, mas vai ter muita gente socialmente branca que está ali somente com a finalidade de acessar o recurso do fundo eleitoral. É uma questão grave que a gente precisa elaborar sobre e denunciar. Isso não pode ser normalizado.

 

Capa do livro Mulher Preta na Política
Capa do livro Mulher Preta na Política(foto: Divulgação)

 

Para quem a senhora indica a leitura?

É um livro que deveria ser lido por todo mundo que está interessado em compreender como é esse desequilíbrio de gênero e de raça nas instâncias de representação política, porque é assim que a gente amplia a consciência e pode transformar. Eu tenho uma enorme vontade que esse livro chegue a muitas mãos, sobretudo às de mulheres, de mulheres negras. Mas um homem branco pode ler o livro também, para entender melhor como é essa situação a partir do relato de uma mulher preta. Uma mulher preta vai utilizar o livro dentro de uma outra perspectiva, ele pode ajudá-la nesse desafio de fortalecimento, encorajamento, de entender que ela pode, sim, ocupar esse espaço, que vai ser duro, mas que é um trabalho coletivo que precisa ser realizado.

Mesmo com essas dificuldades, estamos ocupando os espaços. O que a senhora espera do futuro?

Quando eu estava finalizando esse livro, foi exatamente quando houve a composição do governo Lula, e eu também registrei o quanto que isso abriu a avenida de esperança. Porque ao mesmo tempo em que essas nomeações são resultados de uma luta que pressiona a paisagem do poder, é uma conquista que abre novos horizontes. É só é possível isso acontecer em um governo comprometido com a democracia. Então, a conquista democrática de 2022 é fundamental para o avanço democrático de direitos das pessoas que sempre tiveram suas trajetórias interrompidas ou obstaculizadas pelas barreiras do racismo e do sexismo.