O absurdo da celebração da ditadura ou a celebração dos absurdos do Judiciário

Tenho certeza de que, na onda de absurdos, tão logo se tenha datas o Judiciário permitirá celebrações e homenagens ao trabalho do presidente na pandemia

O absurdo da celebração da ditadura ou a celebração dos absurdos do Judiciário

ARIOVALDO RAMOS

O absurdo da celebração da ditadura ou a celebração dos absurdos do Judiciário

Tenho certeza de que, na onda de absurdos, tão logo se tenha datas o Judiciário permitirá celebrações e homenagens ao trabalho do presidente na pandemia

Por Ariovaldo Ramos | para a RBA

Publicado 20/03/2021 - 10h02

Agência Brasil

Perto de 300 mil mortos pela covid no país, e o presidente, além de tentar atrapalhar a vida de governadores que tentam levar a sério o combate à pandemia, pede autorização para o Judiciário para comemorar a ditadura, em 31 de março. E o Judiciário permitiu! Será a celebração do absurdo e o absurdo da celebração.

A ditadura brasileira, instalada em 1º de abril de 1964, que durou até 15 de março de 1985 sob comando de sucessivos governos militares, teve início com o golpe militar que derrubou governo João Goulart, o presidente democraticamente, eleito. O regime pôs em prática atos institucionais, destaque para o Ato Institucional número 5 (AI-5), de 1968, que vigorou por 10 anos, em que as liberdades civis foram suspensas.

Apesar de o combate aos opositores do regime ter sido marcado por torturas e mortes, as Forças Armadas sempre mantiveram um discurso negacionista. E só em setembro de 2014 a possibilidade de tortura e assassinatos foi admitida em resposta à Comissão Nacional da Verdade. Estima-se que houve 434 pessoas entre mortos e desaparecidos durante o regime, além de um genocídio de cerca de 8,3 mil índios.

Talvez, diante desse absurdo, de comemorar a ditadura, outras datas que reforçam o espírito implementado na ditadura devessem ser comemoradas, com a anuência do Judiciário.

Temporada de celebrações

Massacre do Carandiru

Uma chacina que ocorreu no Brasil em 2 de outubro de 1992, quando uma intervenção da Polícia Militar do estado de São Paulo, para conter uma rebelião na Casa de Detenção, causou a morte de 111 detentos. O coronel Ubiratan Guimarães foi inicialmente condenado, mas, no ano seguinte ele foi eleito deputado estadual por São Paulo, durante o trâmite do recurso da sentença de 2001, e em 15 de fevereiro de 2006 desembargadores julgaram que a sentença, proferida em julgamento, continha um equívoco. E essa revisão acabou absolvendo o réu.

Chacina da Candelária

Ocorreu na noite de 23 de julho de 1993, próximo à igreja da Candelária, no centro da cidade do Rio de Janeiro. Oito jovens foram assassinados! Posteriormente, descobriu-se que os autores do disparo eram milicianos, como resultado seis menores e dois maiores morreram, e várias crianças e adolescentes ficaram feridos. Todas as vítimas eram pobres e negras.

Muitos outros eventos semelhantes a estes , na cidade e no campo, poderiam ser demarcados no Brasil, e dentro do espírito da comemoração da ditadura militar, poder-se-iam proclamar como heróis os mandantes e os executores.

 

Ainda não dá para comemorar a devastação de biomas como a Amazônia e o Pantanal, por exemplo, por falta de uma data e dos responsáveis. Mas dá para homenagear a Vale, que controlava a Samarco. E assim responsável pelo maior desastre ambiental na área de mineração do mundo, que devastou a bacia hidrográfica do Rio Doce. Além de causar cerca de 19 mortes, no dia 5 de novembro de 2015.

Ainda não dá para homenagear o presidente pela condução da política sanitária na pandemia da covid, porque a matança ainda não acabou. Logo, ainda não temos uma data. Mas tenho certeza que tão logo se tenha datas o Judiciário permitirá celebrações e homenagens.

RBA