O GOVERNO DO DF, OS CONFLITOS SOCIAIS E AS VARIÁVEIS OPERACIONAIS DO EMPODERAMENTO DA COMUNIDADE
A gestão pública deve eliminar o modelo burocrático de administração e permitir maior participação dos cidadãos na formulação, implantação e monitoramento das políticas públicas, a fim de eliminar o clientelismo, o paternalismo e o favoritismo, que são mecanismos típicos do patrimonialismo. Desse modo, devem-se fortalecer as estruturas de controle baseadas na democracia participativa dos entes comunitários, por intermédio de mecanismos que tornem possível à representação comunitária fiscalizar o desempenho e a prática da burocracia estatal, inclusive fiscalizar os próprios parlamentares, com controle rígido, passo a passo, dos processos administrativos, em vez do controle efetuado à posteriori.
Não existe possibilidade de mudança nas relações entre o Estado e a Sociedade se não houver transformação na gestão pública, com adoção de novas práticas de interlocução e participação, pondo em prática modos e instrumentos novos para fazer viver a democracia. Assim, aproximar o cidadão do Estado é democratizar sua participação nas questões que lhe afetam. Para que o empoderamento comunitário se torne efetivo, é preciso que a Administração Pública forneça aos cidadãos informações claras sobre todos os seus atos.
Dar poder à comunidade significa praticar a democracia em sua forma participativa. O abandono dos espaços de decisão como privilégio de poucos é uma superação que só pode ser efetuada pela ação coletiva desenvolvida pelos indivíduos, no trabalho de aquisição de uma consciência social que lhes amplie a possibilidade de aquisição de novos direitos, ou de fazer valer os direitos adquiridos de forma legítima.
É no território local que se encontram as instituições importantes no cotidiano de vida da população. Uma nova cultura política pública no Distrito Federal reivindica sua construção a partir dos critérios dos direitos sociais, econômicos, políticos e culturais que, começando do poder local nas próprias cidades-satélites, contraponham-se às práticas clientelistas e corporativas de grupos patrimonialistas oligárquicos.
Faz parte da implantação dessa nova mentalidade que os cidadãos exerçam a fiscalização sobre os poderes públicos constituídos, por intermédio da criação de Fóruns de Defesa das Comunidades. Tal intervenção política ensejará, de certa forma, uma gestão social compartilhada proveniente de exercícios públicos deliberativos.
Uma das funções de quem governa é a de resolver os conflitos sociais de modo a tornar possível uma convivência entre indivíduos e grupos que representam interesses diversos – e, quanto mais aumentam os conflitos, mais aumenta a dificuldade de dominá-los. Os princípios democráticos demarcados pelos critérios de justiça, liberdade, solidariedade, igualdade e respeito às diferenças devem ser redefinidos pelo reconhecimento, por parte do governo, dos conflitos e divergências dimensionados sem
que as elites governantes se sintam ofendidas no equacionamento das questões sociais a partir do processo de negociação cidadã. Para tanto, as estruturas participativas devem ser organizadas em patamares autônomos e independentes do governo, embora com ele mantenham um diálogo constante e de iniciativa bilateral.
Como um dos atores fundamentais do poder local, a participação da sociedade civil organizada no processo do empoderamento da comunidade reveste-se da possibilidade de mudar a sua própria cultura, de tradição muitas vezes corporativista pelos vícios adquiridos no processo de cooptação que a política oligárquica lhe impôs.
Embora o tenhamos conceituado num ângulo que possa parecer generalizado, o empoderamento da comunidade não pode ser encarado de maneira absoluta, em razão de suas inúmeras possibilidades, o que somente a vontade social poderá determinar, conforme as variantes locais relativizem as idiossincrasias de cada bairro e cidade. Também não se pode imaginar que o empoderamento da comunidade se afirme igualitariamente com as elites políticas em todos os âmbitos e imediatamente. A questão que se coloca, em princípio, é de um condicional equilíbrio para que a distância entre os mais e os menos empoderados se reduza, embora não necessariamente se elimine.
Trata-se, pois, de pesar as variáveis operacionais do empoderamento da comunidade com relação aos níveis ou sujeitos de empoderamento, às motivações do empoderamento, aos recursos do empoderamento e às modalidades de empoderamento. Inclusive, o nível de empoderamento possui suas próprias limitações culturais, de acordo com o grau de desenvolvimento histórico de conquista social e econômica em que se encontre, seja quando se trata de mulheres, negros, catadores de resíduos sólidos, escola de samba ou categorias de trabalhadores, por exemplo.
Cruzeiro-DF, 9 de junho de 2020
SALIN SIDDARTHA