Ex-presidenta do Senado da Bolívia denuncia Macri e Lenín Moreno por apoio ao golpe: ''postura indolente e desumana''

Adriana Salvatierra foi presidenta da Câmara de Senadores da Bolívia desde 18 de janeiro de 2019 até o momento da derrubada de Evo Morales, em novembro do mesmo ano, quando apresentou sua demissão e se refugiou na embaixada do México.

Ex-presidenta do Senado da Bolívia denuncia Macri e Lenín Moreno por apoio ao golpe: ''postura indolente e desumana''

Ex-presidenta do Senado da Bolívia denuncia Macri e Lenín Moreno por apoio ao golpe: ''postura indolente e desumana''

 

 

 

Por Nodal

 

 

Adriana Salvatierra (Reprodução/Urgente.bo)

Créditos da foto: Adriana Salvatierra (Reprodução/Urgente.bo)


Adriana Salvatierra foi presidenta da Câmara de Senadores da Bolívia desde 18 de janeiro de 2019 até o momento da derrubada de Evo Morales, em novembro do mesmo ano, quando apresentou sua demissão e se refugiou na embaixada do México. Nesta entrevista, ela desnuda detalhes da violência exercida para que ela renunciasse ao cargo, e da perseguição desenfreada contra os partidários de Evo. Sobre as armas enviadas aos golpistas pelo então presidente da Argentina Maurício Macri, não vacila em afirmar que “sua postura frente ao golpe me parece uma posição indolente e desumana”.

Leia a entrevista na íntegra:

Como você recorda o momento do golpe de Estado?

Eu acredito que não se pode fazer uma abordagem subjetiva do golpe. Os especialistas internacionais afirmam que na Bolívia aconteceram massacres repressivos que deixaram um saldo de 37 compatriotas mortos. A direita usou desse relato para justificar a violência, precisavam exercer violência porque pelo voto nunca chegariam ao poder. Muita gente pensa que quando alguém anuncia sua renúncia é porque acordou uma manhã com o humor diferente, e não é assim. Todos nós que estávamos na linha de sucessão fomos perseguidos. Minha casa, naquela manhã, foi cercada por vizinhos que na verdade eram ativistas. Em Potosí, na casa do meu companheiro, Víctor Borda, fizeram o mesmo, mas entraram em seu lar e queimaram sua casa. E também sequestraram o irmão dele, a quem humilharam em uma praça pública, cometendo inclusive constrangimentos de teor sexual, e o torturaram publicamente para forçar a renúncia de Víctor. Ou seja, se você vê o que estão fazendo com alguém que ocupa o mesmo posto que você, sabe que o que vai acontecer contigo é muito parecido. Essa é a explicação para nossas renúncias.

Cada vez aparecem mais provas do apoio de Maurício Macri à ditadura. Qual é sua opinião sobre isso?

Me parece uma visão canalha de alguns que tentam negar a existência de um golpe de Estado para negar o nível de responsabilidade no intercâmbio de material repressivo entre os países. Macri se incomodava com o processo de mudança da Bolívia, e preferiu se unir ao Equador para enviar material repressivo contra o povo boliviano, isso é indiscutível. E hoje nega a existência de um golpe de Estado para esconder sua responsabilidade e sua participação neste processo, para mim, é uma posição indolente e desumana.

Como você analisa esta aparente atuação conjunta dos governos da Argentina e do Equador?

Essa articulação regional para praticar atos repressivos contra os povos não é algo que vemos com frequência. De fato, acredito que esse tipo de articulação regional para reprimir os movimentos sociais, os militantes dos partidos políticos associados à esquerda, não era vista desde o período das ditaduras. Por isso é importante apontar as responsabilidades que possam ter tido Macri ou Lenín Moreno [presidente do Equador] a respeito disso, tanto através da Justiça boliviana, como de seus respectivos países.

Qual é a importância da acusação feita pelo Ministério Público Fiscal da Bolívia contra Jeanine Añez por genocídio?

Para apurar este fato, veio à Bolívia um grupo interdisciplinar de especialistas para revisar o que aconteceu durante esses dias [os dias do golpe], e determinaram que se perpetrou um massacre e que existia um marco legal de impunidade para que fosse efetivado. E esse marco legal de impunidade foi possível por um decreto que Añez firmou junto a todo seu gabinete, que teve uma vigência de não mais que 15 dias, e o que esse decreto fazia era eximir de responsabilidade penal as forças armadas por sua participação na contenção dos distúrbios. Ou seja, se uma pessoa morresse, as forças armadas não teriam responsabilidade, por isso o Ministério Público emitiu um pedido ao Tribunal Supremo de Justiça para que se inicie o processo judicial de investigação do papel de Añez nos massacres.

*Publicado originalmente em 'Nodal' | Tradução de Mariana Serafini