Ganharam, mas não levaram: reitores eleitos se unem para tomar posse em institutos federais

Heranças de Weintraub, gestores 'pro-tempore' foram escolhidos no lugar dos professores mais votados nas urnas do IFRN, IFSC e CEFET-RJ

Ganharam, mas não levaram: reitores eleitos se unem para tomar posse em institutos federais

EDUCAÇÃO

Ganharam, mas não levaram: reitores eleitos se unem para tomar posse em institutos federais

Heranças de Weintraub, gestores 'pro-tempore' foram escolhidos no lugar dos professores mais votados nas urnas do IFRN, IFSC e CEFET-RJ

Victor Ohana

VICTOR OHANA

 

O presidente Jair Bolsonaro e o então ministro da Educação Abraham Weintraub. Foto: Carolina Antunes/PR

O PRESIDENTE JAIR BOLSONARO E O ENTÃO MINISTRO DA EDUCAÇÃO ABRAHAM WEINTRAUB. FOTO: CAROLINA ANTUNES/PR

Três professores de instituições federais se reuniram pela terceira vez na quinta-feira 22 para debater o famoso problema do “ganhou, mas não levou”: apesar de terem vencido as eleições para a reitoria em suas unidades, foram impedidos de tomar posse. São eles José Arnóbio de Araújo Filho, do Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN); Maurício Saldanha Motta, do Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca do Rio de Janeiro (Cefet-RJ); e Maurício Gariba Junior, do Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC).

Os docentes tentam montar uma articulação nacional com movimentos sociais para atrair visibilidade aos casos. Graças a dois encontros, eles dizem ter realizado uma reunião com o Ministério da Educação (MEC) na quarta-feira 21, por mediação da deputada federal Dorinha Seabra Rezende (DEM-TO). “Esse canal foi aberto. Tem a a promessa de olharem os processos”, diz um dos reitores eleitos. Eles conversaram com Wandemberg Venceslau Rosendo dos Santos, recém-chegado na chefia da Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica (SETEC-MEC).

Na gestão do presidente Jair Bolsonaro, cresceram conflitos por eleições vencidas e não cumpridas nas instituições de ensino. O tema virou discussão no Supremo Tribunal Federal (STF): em 9 de outubro, o ministro Edson Fachin abriu as votações referentes à Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6565, movida pelo PV, que diz que o governo Bolsonaro vem promovendo “intervenção branca” nas universidades federais ao usar uma lei para não dar posse aos primeiros colocados em eleições para a reitoria. Os ministros ainda devem discutir a pauta no plenário.

Só que Arnóbio, Saldanha e Gariba não devem ser afetados diretamente pelo julgamento, segundo avaliação do grupo. Isso porque a pauta do Supremo trata das universidades federais, enquanto os três foram eleitos para dirigir instituições que têm uma legislação distinta.

Diferentemente das 69 universidades federais brasileiras, essas instituições pertencem à Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, criada em 2008. A rede conta com 38 institutos federais, além dos CEFETs do Rio de Janeiro e de Minas Gerais, as escolas técnicas vinculadas às universidades federais, o Colégio Pedro II e a Universidade Tecnológica do Paraná (UTFPR).

Essas instituições têm uma forma particular de fazer eleições para a reitoria. Enquanto as universidades federais elegem uma lista com os três mais votados – a chamada lista tríplice, submetida à escolha do presidente da República – , as instituições federais elegem somente um nome para a reitoria, conforme descreve o Artigo 10 do Decreto nº 6986/2009: “O processo de consulta será finalizado com a escolha de um único candidato para cada cargo”.

O decreto não diz claramente que o chefe do Palácio do Planalto é obrigado a acatar o nome escolhido pela comunidade. Por outro lado, o Artigo 1º, que trata da questão, diz que esses institutos “serão dirigidos por um reitor, nomeado pelo presidente da República, a partir da indicação feita pela comunidade escolar“.

É a esse artigo que os três se apegam para reivindicar o direito à posse. Mas o componente político, segundo eles, também conta. Em relatos a CartaCapital, os docentes se dizem vítimas de informações falsas, de desrespeito à autonomia do sistema democrático e de meses de atraso na conclusão dos impasses.

 

No IFRN, barraca ‘Lula Livre’ levou Arnóbio à Justiça

Em 9 de dezembro de 2019, o Conselho Superior do IFRN validava, com unanimidade, o resultado da eleição para o mandato entre 2020 e 2024 na reitoria. José Arnóbio ficou na 1ª colocação com 48,25% dos votos, seguido de Wyllys Abel Farkatt Tabosa, com 42,26%, Jose Ribeiro de Souza Filho, com 3,22%, e Ambrósio Silva de Araújo, com 2,77%, de acordo com índices da Comissão Eleitoral Central.

Quinze dias depois, em 24 de dezembro de 2019, o MEC lançava a Medida Provisória 914/2019, que designava a escolha do “reitor pro-tempore” nos casos de “vacância simultânea dos cargos de reitor e vice-reitor” e “impossibilidade de homologação do resultado da votação em razão de irregularidades verificadas no processo de consulta”. A MP 914 resultou em uma novela entre autoridades sobre a autonomia das instituições de ensino.

Pois bem. Passados quatro meses, em 17 de abril, o então ministro Abraham Weintraub nomeou um “reitor pro-tempore” que não havia sequer concorrido às eleições: Josué de Oliveira Moreira, que aparece como filiado ao PSL no sistema do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Nas redes sociais, em 20 de abril, o MEC alegou que José Arnóbio passou a ser alvo de um Processo Administrativo Disciplinar (PAD).

“Em observância ao princípio da razoabilidade, até que o caso seja definitivamente resolvido, o MEC designou um reitor pro-tempore para comandar o IFRN”, disse o ministério.

José Arnóbio diz que ficou surpreso com a decisão do MEC e afirma ter solicitado, via Lei de Acesso à Informação (LAI), os motivos para não ter tomado posse.

Após 15 dias, o MEC disse que identificou, por meio de auditoria interna do próprio IFRN, uma denúncia contra José Arnóbio sobre “utilização de espaço do instituto para manifestação do interesse do Partido dos Trabalhadores – PT”. A decisão em não nomeá-lo reitor, portanto, teria se baseado nos “princípios da moralidade administrativa e da razoabilidade”, segundo o MEC, e teria validade até a conclusão da investigação.

 

O Ministério citou a instalação de uma tenda para o funcionamento do ‘Comitê Lula Livre RN – Brigada Djalma Maranhão’ no campus em que José Arnóbio foi diretor, em Natal

 

O caso em questão é de julho de 2019.

José Arnóbio era diretor havia oito anos do campus de Natal quando autorizou a cessão do espaço para a realização do 11º Encontro Nacional de Fé e Política, nos dias 12, 13 e 14 de julho. Em documento, os organizadores do evento se declaram membros do Movimento Nacional de Fé e Política, um movimento cristão criado em 1989 que promove os encontros desde 2000 em diferentes espaços. Como o movimento não tem personalidade jurídica, ele procura parcerias com as instituições locais. No ano em questão, fez uma parceria com outro movimento, o Serviço de Assistência Rural e Urbano (SAR), também de cunho religioso, fundado em 1949 sob orientação da Arquidiocese de Natal.

No encontro, os movimentos separam um espaço para uma feira popular, que eles chamam de “Feirinha Solidária”. Na edição realizada no IFRN, os organizadores do evento dizem ter sido procurados por “integrantes do Comitê Lula Livre”, que pediram espaço para montar o “bazar Lula Livre”. À época, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ainda estava preso em Curitiba. Os coordenadores afirmam ter acatado a solicitação “com base nos princípios da equidade e do pluralismo” e considerando que “se trataria de uma presença acessória e não essencial”. Eles dizem ainda que nenhuma palestra foi proferida ou qualquer mesa foi composta pelos membros do comitê. “Tratou-se tão simplesmente de ‘uma barraca em meio às outras'”, declararam os organizadores.

Contudo, um homem entrou no IFRN em 12 de julho, filmou a barraca e publicou o vídeo na internet. As imagens seguem disponíveis no YouTube, no canal do jornalista Bruno Giovanni. Em seguida, um militante do Movimento Brasil Livre (MBL) chamado Jaime Luiz Groff Junior, candidato a deputado federal pelo partido Novo em 2018, apresentou uma denúncia ao Ministério Público Federal (MPF) sobre a presença da barraca, com o vídeo e mais duas fotos.

Em 5 de agosto de 2019, o então reitor Wyllys Abel Farkatt Tabosa abriu uma comissão de sindicância investigativa para apurar os fatos, porque o MEC proíbe que as instituições públicas de ensino incentivem “movimentos político-partidários” e promovam “participação de alunos em manifestações”. Segundo José Arnóbio, a sindicância investigativa não avançou – em setembro, uma nota da Procuradoria Federal junto ao IFRN dizia que era necessário apurar melhor o contexto em que o fato reportado como ilícito foi executado. Uma nova apuração, por meio de sindicância punitiva, foi aberta em 12 de fevereiro deste ano, relativa à responsabilidade de Arnóbio no evento.

José Arnóbio diz que não pôde se defender na sindicância investigativa, porque nessa modalidade não há oitivas. Na punitiva, ainda não foi ouvido, porque os trabalhos da sindicância foram paralisados em função da pandemia e retornaram há cerca de um mês. Em 11 de março, apresentou à sindicância punitiva uma defesa prévia de 13 páginas, em que anexa uma carta pela qual o próprio Comitê Lula Livre reivindica a responsabilidade da instalação da barraca no evento. Arnóbio também argumenta que o Comitê é “suprapartidário” e que, ainda assim, recomendou ao Comitê a retirada da barraca para evitar “interpretações maliciosas quanto ao desvio de finalidade do evento”, mas que não tinha competência para praticar esse ato.

Filiado ao PT desde 2015, José Arnóbio diz acreditar que “talvez” a sua ligação partidária possa ter influenciado o impasse, mas ressalta que nunca foi candidato nem integra alguma instância burocrática da sigla. Além disso, reclama que “não é proibido” aos reitores ter ligação com um partido. De acordo com o TSE, o reitor anterior, Wyllys Tabosa, foi filiado ao PT entre 1986 e 2019 e é candidato a vereador pelo PV neste ano. O reitor temporário nomeado por Weintraub, Josué Moreira, não somente faz parte do PSL, como foi indicado pelo deputado federal General Girão (PSL-RN), conforme o próprio parlamentar assumiu em entrevista à rádio 98 FM em 30 junho deste ano.

Após descobrir que a sindicância era o impedimento à sua posse, José Arnóbio entrou uma ação em 1ª instância na 4ª Vara Federal do Rio Grande do Norte, pedindo uma liminar, ou seja, uma determinação provisória, para suspender os efeitos da nomeação de Josué Moreira e permitir a posse imediata do reitor eleito. O pedido foi aceito em 1º de maio, por decisão assinada pela juíza Gisele Maria da Silva Araujo Leite. A magistrada entendeu que está afastada a hipótese de implicação à “idoneidade moral e reputação ilibada” e citou o princípio constitucional da “presunção de não culpabilidade”, isto é: ele é inocente até que haja condenação judicial transitada em julgado, quando todos os recursos possíveis estiverem esgotados.

Cinco dias depois, em 6 de maio, às 16h, o MEC cumpriu a decisão judicial em 1ª instância e nomeou José Arnóbio como reitor do IFRN. No entanto, o governo recorreu à 2ª instância, no Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5), e, duas horas depois, a liminar foi cassada e ele foi exonerado do cargo. “Acho que fui o reitor mais rápido na história dos institutos federais”, comenta José Arnóbio. O reitor eleito pediu reconsideração da decisão.

A situação agora é que o processo tramita nas duas instâncias.

Na 1ª instância, com a liminar cassada, José Arnóbio espera que a juíza decida sobre o mérito da questão, ou seja, dê uma decisão definitiva. Ainda não há previsão para isso. O Ministério Público Federal (MPF) já deu a sua opinião sobre o assunto: é a favor da ação de José Arnóbio e diz que ele foi “eleito democraticamente”. Na 2ª instância, ele aguarda que o colegiado de desembargadores julgue o processo.

 

O que está posto é um desmantelamento das instituições públicas de ensino federal do País, que tem como mote um processo intervencionista, com impulsionamento ideológico alinhado com o atual governo, avalia José Arnóbio

 

IFSC: Gariba diz sofrer processo em que não pôde se defender

Mauricio Gariba Júnior ganhou a eleição para reitor com 36,29% dos votos, contra 26,08% do 2º colocado (André Dala Possa). A disputa em 1º turno ocorreu em 13 de novembro de 2019, e em 2º turno, em 5 de dezembro daquele ano. O resultado foi homologado pelo Conselho Superior (Consup) em 16 de dezembro de 2019. A posse estava prevista para 20 de abril de 2020.

Dias antes da posse, em 30 de março, o MEC teria encaminhado uma solicitação à reitoria vigente naquela data para saber se Gariba Júnior tinha problema com algum processo, segundo conta o professor. Ele diz, porém, que não ficou sabendo da resposta dada pela reitoria, na época sob poder de Maria Clara Kaschny Schneider.

 

Verificamos que, no sistema do MEC, além do processo eleitoral, surgiu outro processo de escolha de um reitor pró-tempore. E aí a gente ficou preocupado, diz Gariba.

 

Em 4 de maio deste ano, o MEC publicou no Diário Oficial da União a nomeação do 2º colocado das eleições, André Dala Possa, como reitor pro-tempore. Ele ainda está no cargo. A portaria foi assinada por Abraham Weintraub.

O MEC se explicou em nota técnica da Setec, de 17 de junho deste ano. A pasta citou que faltava a conclusão de um processo contra Gariba, em andamento da Controladoria-Geral da União (CGU). “Tem-se que o mencionado servidor não poderá ser nomeado e tomar posse, enquanto não finalizada a apuração a cargo da CGU e esclarecida a situação averiguada”, diz o documento.

O processo na CGU vem de uma sindicância investigativa da IFSC instaurada pela então reitora, Maria Clara Schneider, aberta em 21 de agosto de 2018 e concluída em 6 de dezembro de 2018. Segundo a sindicância, Gariba seria o suposto responsável por irregularidades quando foi diretor do campus de Florianópolis. A irregularidade trata de equipamentos comprados em 2010, no valor de 68,3 mil reais por meio de um pregão, mas que não foram usados. Segundo relatório, Gariba, que virou diretor no campus em 2011 e herdou os equipamentos, teria apresentado “erros no planejamento” ao instalá-los.

“Quando eu assumi, instalamos a catracas com muita dificuldade, porque não tinha um planejamento até então, faltava a parte elétrica, adaptação civil, entre outras. Quando fomos integrar as catracas ao sistema acadêmico, o corpo técnico disse que não dava”, diz Gariba. O tal sistema acadêmico só chegou a ser adequado em 2018.

Gariba diz que não teve direito à defesa na sindicância.

 

EX-MINISTRO DA EDUCAÇÃO, ABRAHAM WEINTRAUB NOMEOU “REITORES PRÓ-TEMPORE” EM INSTITUIÇÕES. FOTO: AGÊNCIA BRASIL

 

Para a sua surpresa, diz ele, a reitora Maria Clara Schneider encaminhou o resultado da investigação de 2018 à CGU sem o seu conhecimento. O processo ainda não foi julgado pela CGU. Ele diz que ainda não foi chamado pela Controladoria para apresentar sua defesa.

“O MEC se justifica nesse processo para eu não assumir. Ele esquece que, na Constituição, existe a presunção de inocência. E o processo não chegou até o final”, argumenta ele.

Questionado se acredita que há alguma preferência ideológica por parte do MEC em relação ao outro reitor pro-tempore, Gariba diz que entende que não vê essa relação direta, mas “há uma quebra do processo democrático” e uma “forma de intervenção” nas instituições. O reitor eleito não é filiado a nenhum partido.

Gariba, então, entrou com uma ação na 3ª Vara Federal de Florianópolis em que pediu a suspensão dos efeitos da nomeação do reitor pro-tempore e determinar sua posse, em caráter liminar. Porém, o juiz Diógenes Tarcísio Marcelino Teixeira indeferiu o seu requerimento e argumentou que o pedido encontra empecilho na Lei 8.437/1992, que trata de medidas liminares contra o poder público. Para o juiz, os atos dos ministros do governo “estão sujeitos à competência do Superior Tribunal de Justiça”.

Em recurso à 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), Gariba também sofreu revés e teve o pedido negado. A sua defesa avalia levar à liminar para análise no STJ.

Um parecer de um grupo de trabalho da Comissão de Direitos Humanos da OAB, de 12 de agosto, não entrou no mérito do processo do qual Gariba é alvo, mas defendeu o princípio de presunção de inocência. Para a comissão, “a presunção de inocência morreu” no caso.

“O fundamento da decisão da presidência da República, negando a nomeação do escolhido pela comunidade escolar, é violador dos direitos humanos fundamentais da presunção de inocência, da garantia do devido processo legal, consubstanciado no direito ao contraditório e à ampla defesa do professor Maurício Gariba Junior, e do direito à representatividade política da comunidade acadêmica”, afirma a comissão.

 

Eleito ao CEFET acusa MEC de usar princípio de “presunção de culpa”

Maurício Saldanha Motta foi eleito em 26 de abril de 2019, com 23,75% dos votos, contra 21,82% do 2º colocado (Sérgio Roberto de Araújo) e 13,32% do 3º colocado (Hilário Antônio Rodrigues Gonçalves). Diferentemente dos institutos federais, o CEFET escolhe um diretor-geral em vez de um reitor. Motta sucederia o mandato que acabava em 2 de julho, de Carlos Henrique Figueiredo Alves, de quem foi vice-diretor . O resultado foi homologado pelo Conselho Diretor (CODIR) em 24 de maio daquele ano. A partir disso, passou a tramitar no MEC.

Segundo o Decreto 4877/2003, não há previsão de lista tríplice: o diretor-geral é nomeado pelo ministro da Educação “a partir da indicação feita pela comunidade escolar”.

O problema é que a chapa que ficou na 2ª posição contestou a apuração dos votos. Quando homologou o resultado, o CEFET já tinha conhecimento da queixa, e mesmo assim referendou a eleição. Contudo, segundo Motta, supostas denúncias foram encaminhadas ao MEC em 27 de junho de 2019 contra a chapa vencedora, pedindo a nomeação do 2º lugar. O pedido ao MEC foi protocolado pelo senador Telmário Motta (PROS-RR).

As denúncias foram à apuração da Corregedoria do MEC.

Quando chegou o fim do mandato de Alves, em julho, mês que Motta sairia do cargo de vice e ocuparia a diretoria-geral, o MEC comunicou que ele permaneceria como vice, porque o processo de nomeação do novo diretor-geral estava em análise.

Em 10 de julho de 2019, o Palácio do Planalto lançou um decreto que instituía o cargo do “diretor-geral pro-tempore”, que será ocupado quando “o cargo de diretor-geral estiver vago e não houver condições de provimento regular imediato”. No mês seguinte, o governo nomeou um diretor-geral pro-tempore, ignorando a eleição.

 

Para a nossa surpresa, em agosto de 2019, eu recebo um telefonema do MEC, com a informação de que eles estavam nomeando um diretor-geral pro-tempore, conta Motta.

 

O diretor nomeado não foi nem o 2º colocado da eleição. Aliás, em agosto, ele perdeu o apoio do senador Telmário Mota: o parlamentar de Roraima assinou no dia 28 um ofício a Abraham Weintraub em que diz reconhecer “o equívoco ao apoiar a nomeação do sr. Sérgio Roberto Araújo para o CEFET-RJ”. No mesmo documento, pediu a nomeação e posse de Maurício Saldanha Motta para a diretoria-geral.

Quem entrou no cargo foi Mauricio Aires Vieira, segundo portaria de 15 de agosto daquele ano, assinada por Weintraub. Depois, em portaria de 24 de outubro de 2019, o então ministro nomeou outro diretor pro-tempore, Marcelo de Sousa Nogueira.

Só em 2020 que o MEC descartou a hipótese de fraude na eleição após resultados de investigações. Em 21 de maio, Weintraub assinou um despacho em que anunciou a conclusão da sindicância e afirmou: “acolho o entendimento exposto no relatório e determino o arquivamento do feito no âmbito deste Ministério”. A partir disso, a nomeação de Motta voltaria a tramitar.

Mas Motta se viu diante de um novo impasse. A partir de julho, conta ele, o MEC apontou a existência de uma ação judicial contra ele e seguiu se recusando a nomeá-lo. A ação foi aberta pelo MPF por suposta prática de improbidade administrativa contra o diretor-geral de quem Motta foi vice, Carlos Henrique Figueiredo Alves. Junto a Alves, aparecem Motta e outros quatro servidores públicos do CEFET.

 

O MINISTRO DA EDUCAÇÃO, ABRAHAM WEINTRAUB. FOTO: WALTERSON ROSA/MEC

 

A história dessa ação começa com dois professores do CEFET que se queixaram de sofrer perseguições. Eles alegam que foram alvos de sindicância na instituição sem a observância dos princípios do contraditório e ampla defesa. As sindicâncias foram abertas por Carlos Henrique Figueiredo Alves e compostas pelos outros servidores que constam no processo. Motta diz ter entrado no meio do percurso.

Segundo diz Motta, sua participação no caso foi uma resposta por e-mail, a um desses professores, que não foi satisfatória. O docente pedia, em 29 de setembro de 2016, termos de convênio e extratos de convênios entre o CEFET e a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) firmados desde 1º de janeiro de 2010.

“Eu indiquei a ele onde estava a informação, que ele poderia checar no Diário Oficial. Lá, estariam todos os atos oficiais do CEFET com a UERJ publicados, é só fazer uma busca. Esse professor retorna alegando que não ficou satisfeito com a resposta e que ele queria cópias físicas. Só que, na volta, quem responde é o diretor-geral. Minha participação nesse processo foi fazer uma resposta indicando a esse professor que o que ele pedia está no Diário Oficial. E o MPF encara como descaso ao pedido, fruto da perseguição que eles vinham sofrendo”, afirma Motta.

Até então, não houve condenação pela Justiça, mas as acusações já foram suficientes para impedir a nomeação de Motta. O diretor eleito argumenta que não é aplicado o princípio de presunção de inocência, mas sim o de “presunção de culpa”. Perguntado se a sua posição política interfere de alguma forma nessa história, Motta diz já ter sido alvo de fake news na internet sobre suposta filiação ao PT, mesmo sem ser filiado, mas não sabe comprovar qual seria a relação direta disso com o impedimento de sua nomeação.

Diante do imbróglio, em 21 de agosto desde ano, o ex-reitor da UERJ Nival Nunes de Almeida entrou com a ação na 27ª Vara Federal Cível do Rio de Janeiro, em que pediu a nomeação de Motta no CEFET. Na ação, Almeida argumentou que não há sentença judicial contra Motta. A ação foi acatada pela Justiça: por decisão liminar da juíza Geraldine Vital, em 25 de agosto, foi determinado o prazo de 72 horas para que o MEC nomeasse Motta ao mandato para o qual foi eleito.

No entanto, a Advocacia-Geral da União (AGU) entrou com um recurso que levou a liminar para a 2ª instância, no Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2).

Neste momento, Maurício Motta espera o desenrolar das duas instâncias, assim como José Arnóbio. Na 1ª, com a liminar cassada, ele aguarda o julgamento do mérito. Na 2ª, os desembargadores ainda não se reuniram para dar o veredicto sobre a liminar.

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que colabora no processo em 1ª instância, já deu sua opinião em documento de 27 de agosto: “O fato de o diretor-geral eleito ter sido indicado em ação civil pública não constitui realmente justificativa razoável para evitar sua nomeação, em face do princípio da presunção de inocência previsto no artigo 5º da Constituição”.

 

Esta tem sido uma prática adotada pelo MEC, que passou a intervir e desrespeitar os processos de escolha da comunidade acadêmica nas universidades, institutos federais e centros federais de educação, a exemplo do CEFET/RJ, diz a OAB.