Partido de todos (por Cristovam Buarque)

Os democratas que não querem o PT precisam perder seus preconceitos contra Lula, os petistas e Lula precisam perder a arrogância

Partido de todos (por Cristovam Buarque)

Partido de todos (por Cristovam Buarque)

Os democratas que não querem o PT precisam perder seus preconceitos contra Lula, os petistas e Lula precisam perder a arrogância

Ricardo Noblat

 

Daniel Ferreira/Metrópoles

A falta de renovação fez com que, em 2022, haja um candidato que, em 1989, disputou a primeira eleição direta depois do golpe de 1964; e faz com que nem ele nem os outros candidatos estejam representando propostas novas para o Brasil do futuro, levando em conta as especificidades de nossos problemas na realidade do mundo contemporâneo; alguns são tão internacionalistas que não levam em conta nossas especificidades, outros tão nacionalistas que não consideram a realidade do mundo. Seria melhor que novas lideranças, partidos e discursos tivessem surgido e se afirmado no eleitorado, mas não surgiram ainda e felizmente Lula e o PT sobreviveram com força no eleitorado, para participarem da luta democrática contra a tragédia da reeleição de Bolsonaro.

 

Para isto, Lula precisa perceber que os propósitos da eleição de 2022 são diferentes de 1989, que não é hora de fortalecer o PT, é hora de salvar a democracia. Mais do que buscar sua eleição e fortalecer seu partido, colocar-se como parte do esforço político para barrar a continuidade da tragédia histórica que nos empobrece internamente e isola internacionalmente.


Lembrar que em 2018 seu candidato perdeu devido ao voto nulo de milhões de eleitores que não queriam Bolsonaro, mas rejeitavam o PT. Esta rejeição pode se ampliar, em 2022, por efeito da disputa no primeiro turno. Para evitar a rejeição e o voto nulo, precisa reconhecer as dúvidas e descontentamentos que ainda pesam sobre o PT.


A população já sabe que, pessoalmente, Lula foi condenado em julgamentos sob suspeição de parcialidade, mas o PT precisa parar o negacionismo de que não houve corrupção em seu governo. Malas apreendidas com reais e dólares em contas na Suíça são mais visíveis do que a redondeza da Terra. E dizer como agirá para que isto não se repita. Até o seu negacionismo, em 2008, ignorando a crise mundial, que chamou de “marolinha”, Lula fez um governo com responsabilidade fiscal, mas as falas de assessores ao seu redor permitem temer o negacionismo como doutrina para política econômica irresponsável, com todas as consequências da falta de credibilidade na economia e o sacrifício das camadas pobres, por causa da inflação.


O PT e Lula precisam parar de repudiar os votos de milhões de eleitores descontentes com Bolsonaro, mas considerados golpistas, por terem ido às ruas entre 2013 e 2015 manifestando descontentamento e pedindo o impeachment de um governo do PT. Eles temem que, no poder, Lula reprima manifestações por serem consideradas golpistas. Lula precisa se afastar dos discursos de apoio a regimes autoritários e de sugestões de controle da mídia. Deixar de falar para agradar o grupo a seu redor e falar para o Brasil. Perceber que os sindicatos representam a parte moderna dos trabalhadores, mas não aos pobres; que o interesse das estatais e seus empregados não é sinônimo dos interesses do povo. Libertar-se do discurso nostálgico e obsoleto de tempos passados e defender reformas fundamentais para o Brasil do futuro, para os interesses das novas gerações e dos pobres, no mundo que está surgindo.


Precisa ter a grandeza de perceber que 2022 não é apenas mais uma eleição política para o PT bencer, é uma encruzilhada histórica para a democracia atravessar. Está em jogo mais do que chegar outra vez ao poder, é hora de ser parte do grande movimento de garantia da democracia, enfrentamento da tragédia social, atraso da economia e degradação ambiental, em uma grande aliança de todos os democratas.
Deve ser o partido não apenas dos trabalhadores, mas o partido de todos, amplo, aberto e confiável. Caso contrário, o Brasil corre o risco de outra vez vencer a tragédia, ou vencer o PT restrito, fechado, capaz de ganhar a eleição, mas incapaz de tirar o país do abismo.