História: 5 de setembro de 1961, a Operação Mosquito obrigou o Caravelle a voar alto

História: 5 de setembro de 1961, a Operação Mosquito obrigou o Caravelle a voar alto

História: 5 de setembro de 1961, a Operação Mosquito obrigou o Caravelle a voar alto

 

Publicado por Assembléia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul

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Brizola e Jango, protagonistas da Legalidade Voou alto o Caravelle da Varig prefixo PP-VJD, naquele final de tarde do dia 5 setembro de 1961. Mesmo com o acordo para que o vice-presidente João Goulart, o Jango, assumisse a presidência da República sob regime parlamentarista, dando fim ao impasse político que se prolongava e paralisava o país desde a surpreendente renúncia do presidente Jânio Quadros, ainda havia focos de resistência golpista, especialmente entre os oficiais da Força Aérea Brasileira (FAB).

Operação Mosquito

A ameaça tinha nome: Operação Mosquito. O objetivo: abater a aeronave que levaria Jango até Brasília, para a posse. Assim como nos dias anteriores, medo e incerteza pairavam no ar naquele 5 de setembro de 1961. A movimentação frenética, entretanto, deslocou-se de ambiente. Da Praça da Matriz, as atenções se voltaram para o aeroporto no bairro São João. Os ministros militares, que tensionaram contra Jango, vetando-o ao cargo de presidente do Brasil, agora estavam recuados diante da solução parlamentarista. Mesmo assim, alegavam não ter controle sob os pilotos de caça, como que lavando as mãos diante da sublevação na FAB. Então, o Caravelle voou alto. Foi aos 11.100 pés, fora do alcance dos temidos jatos da Força Aérea. Jango precisava chegar à capital federal para vestir a faixa presidencial que as urnas, e a Constituição, lhe outorgavam.

Mas não foi fácil aquele 5 de setembro. Desde as primeiras horas da manhã, o tumulto em torno do aeroporto já era intenso, com corre-corre de jornalistas concentrados para registrar a partida. A informação de que Jango tomaria posse naquele dia agitava a Nação. No Rio de Janeiro, a notícia de que ele se deslocava para Brasília provocou euforia. Buzinaço nas ruas e chuva de papel picado das janelas saudavam o desfecho da crise política, dando boas-vindas ao novo mandatário da República. Em Porto Alegre, porém, os rostos ainda franziam de preocupação.

Sem discursos na tribuna

Na Assembleia Legislativa, o dia não foi de discursos. O foco era o aeroporto, a viagem, o pouso. Em Sessão Permanente desde o início do impasse, as atas da Casa do Povo não registram oratórias naquele dia, mas os deputados acompanham de muito perto todos os acontecimentos. Inicialmente o Caravelle, preparado cuidadosamente pelo próprio presidente da Varig, Rubem Berta, partiria às 11h30. Como não se tinha a certeza de que o aeroporto de Brasília apresentava condições de segurança para receber Jango, o voo foi abortado. A tensão permeava cada instante do dia na capital gaúcha. Depois de muitos telefonemas e mensagens de rádio, a garantia do pouso tranquilo. Soldados do Exército, em torno de 600 homens, já guarneciam a pista em Brasília, ao mesmo tempo que impediam os caças da FAB de decolar.

Comitivas de autoridades de todas as esferas já aguardavam desde cedo pela chegada de João Goulart na capital federal. Assim como os deputados estaduais gaúchos, os parlamentares do Congresso Nacional também focavam suas atenções ao aeroporto. O plenário da Câmara Federal estava praticamente vazio, mas um deputado, Josué de Castro, como que antevendo qual seria a linha do governo que estava prestes a iniciar, vai à tribuna para ler o Manifesto da Frente Parlamentar Nacionalista, pedindo esforço redobrado para promover a reforma agrária, disciplinar a remessa de lucros ao exterior e adotar uma política externa independente, justamente temas que Jango procurou realizar ao propor as Reformas de Base durante sua gestão, e que muito caro lhe custaram.

A partida

Com a pista protegida em Brasília, era chegada a hora do Caravelle acionar as turbinas no Aeroporto Salgado Filho. Por precaução, foram retirados alguns assentos da aeronave, para acomodar galões de combustível, caso fosse necessário alterar a rota se surgisse algum contratempo. Em meio a todo aquele burburinho, Jango ainda dedicou alguns minutos ao telefone para atender o prefeito de Porto Alegre, Loureiro da Silva. Os dois não se falavam desde que, por divergências internas no PTB, o prefeito rompeu com a sigla e ingressou no Movimento Trabalhista Renovador (MTR). Loureiro da Silva ligou para Jango, no meio da tarde, para prestar solidariedade e apoio. O fato chamou a atenção da imprensa pela reaproximação dos dois líderes.

Às 17h30, uma apreensiva comitiva de 34 pessoas embarca rumo a Brasília. Basicamente políticos e jornalistas. Repórter do Diário de Notícias na época, e personagem que acompanhou diariamente o desenrolar dos acontecimentos, o jornalista Jaime Keunecke, o JK, foi um dos últimos a entrar no avião. “A porta já estava sendo fechada, quando consegui entrar”, recorda JK, que foi homenageado pela Assembleia Legislativa na Sessão Comemorativa pelos 50 anos da Legalidade.

Deputados no voo presidencial

Os deputados estaduais gaúchos, mantendo a tradição política da Assembleia Legislativa, não fugiram de suas responsabilidades. Uma comitiva já havia permanecido em Brasília participando das discussões em torno da emenda parlamentarista. Naquele dia 5 de setembro de 1961, o Parlamento estadual era protagonista dos fatos. Não se sabe exatamente quantos viajaram no mesmo Caravelle que levava Jango. O Jornal do Brasil do dia 6 de setembro de 1961, relata que os deputados José Lamaison Porto, Adaury Pinto Filippi, Poty Medeiros e Lauro Leitão estavam no vôo. Reportagem da jornalista Lorena Paim para o jornal eletrônico Sul 21, de Porto Alegre, apura que também viajaram Sereno Chaise, Affonso Anschau, Marcírio Goulart Loureiro (primo de Jango), Pedro Tassis Gonzáles e Mario Mondino.

Tanto o Jornal do Brasil da época, quanto a matéria on-line do Sul 21 concordam que havia três deputados federais na aeronave: Paulo Mincarone, Wilson Vargas e Rui Ramos, o mouro do Alegrete, como era chamado pelos companheiros do PTB. Naqueles dias conturbados, Rui Ramos foi figura destacada. O jornal Correio do Povo de 30 agosto de 1961 traz uma notícia em que o deputado federal gaúcho pede ao presidente da República em exercício, Ranieri Mazzili, para que prenda o ministro da Guerra, marechal Odílio Denys, um dos líderes da conspiração golpista que vetou Jango.

Portanto, com mais ou menos edis, o certo é que o Parlamento gaúcho estava lá, no olho do furacão, ao lado da Constituição e do interesse público, pela legalidade. Os deputados, de todos partidos, se uniram pela causa. Durante a viagem, lembra o jornalista JK, foram servidos sanduíches e refrigerante. Numa conversa à bordo, Jango convida o general Amaury Kruel para ser o chefe da Casa Militar do governo que começaria dois dias depois, em 7 de setembro.

Prontidão até a posse

Para que nada desse errado na chegada, o legalista governador de Goiás, Mauro Borges, prontifica-se a fazer um teste no aeroporto de Brasília, pousando instantes antes para certificar-se de que a pista estava mesmo liberada. Só então, o Caravelle pousou sem problemas, exatamente às 20 horas e 14 minutos daquele 5 de setembro. Recebido por muitos políticos e jornalistas, Jango começa ali a discussão em torno dos nomes que iriam compor o seu ministério e quem poderia ser o Primeiro-Ministro.

Para alguns escritores e historiadores, a Campanha da Legalidade termina com a chegada de Jango na capital federal, embora Brizola tenha mantido a tropa e os microfones em prontidão até a posse, no dia 7. No dia em que o modelo Caravelle, primeiro avião comercial a jato de médio curso produzido na França a partir de 1955, voou alto pelos céus do Brasil, o que os brasileiros mais queriam é que ele chegasse ao destino. E a Assembleia gaúcha foi até o fim, para assegurar que realmente chegaria.

Fontes consultadas

• Jornal do Brasil (setembro de 1961)

• Jango, Uma Biografia (Jorge Ferreira)

• Jornal eletrônico Sul 21

• Revista do PDT-RS 50 anos da Legalidade

• Correio do Povo (agosto e setembro de 1961)