“Brasil tem que investir na indústria de defesa. Não podemos perder a Avibrás”, afirma militar
“Brasil tem que investir na indústria de defesa. Não podemos perder a Avibrás”, afirma militar
Por Hora do Povo Publicado em 23 de junho de 2024
Robinson Farinazzo e a fragata classe Niterói (Fotomontagem HP)
O comandante Robinson Farinazzo advertiu os deputados, em audiência pública na Câmara, que a indústria de defesa “não é como uma padaria”. “Ela não existe para dar lucro, ela existe para atender a soberania de um país”, enfatizou
O ex-fuzileiro naval, comandante Robinson Farinazzo, consultor militar, articulista e autor de livros sobre geopolítica e tecnologia aeronáutica, afirmou, no último dia 18 de junho, em audiência pública na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da Câmara dos Deputados, que o Brasil precisa investir em sua indústria de defesa.
“Nós não podemos perder uma empresa como a Avibrás, que tem 60 anos de expertise. E a Avibrás está quebrando por quê? Porque o principal comprador, que deveria ser o governo brasileiro, não compra na proporção exata”, advertiu o militar.
Ele acrescentou que “é baixíssimo o incentivo à indústria nacional”. “A indústria de defesa não é como uma padaria, ela não existe para dar lucro, ela existe para atender a soberania de um país. Nós não podemos perder a Avibrás de forma alguma”, destacou Farinazzo.
“A Avibrás está quebrando por quê? Porque o principal comprador, que deveria ser o governo brasileiro, não compra na proporção exata”
Ele advertiu sobre as ameaças à soberania do Brasil e deu como exemplo declarações de autoridades estrangeiras sobre a Amazônia. “O ex-comandante militar da OTAN diz que as queimadas no Brasil ameaçam a segurança dos EUA”, apontou.
“Já Macron, presidente da França, disse que a Amazônia é um bem comum e o primeiro-ministro do Reino Unido pediu a privatização da Amazônia e aconselhou a ONU a sancionar o Brasil pelo aumento do desflorestamento”, acrescentou.
“Ninguém é negacionista sobre os problemas de desflorestamento. Mas essa linha de trabalho de autoridades europeias e americanas é a mesma que foi usada para demonizar o Iraque no ano de 2002 com relação a armas de destruição em massa, que nunca existiram. Criou-se uma narrativa para justificar uma invasão que custou a vida de mais de 600 mil cidadãos do Iraque”, denunciou o fuzileiro naval.
Ele relatou que essa solicitação de sanções ao Brasil na ONU, de 13 de dezembro de 2021, pouco antes do início da guerra na Ucrânia, surgiu quando se colocou problemas climáticos como questão de segurança internacional. “A Rússia e a Índia vetaram. Se isso fosse aprovado, abriria precedentes para, no futuro, a gente ter uma intervenção no Brasil com pretextos de segurança climática. Não estamos num mundo seguro e nem amigável para as riquezas do Brasil’, alertou.
“Não estamos num mundo seguro e nem amigável para as riquezas do Brasil”
Farinazzo falou também sobre a falta de continuidade de projetos militares. “Vários projetos que eu conheci na Marinha nasceram e morreram. A Marinha tinha um projeto excelente, o projeto das fragatas classe Niterói dos anos 70. Infelizmente, por diversos fatores, não foi dado continuidade. Se o Brasil tivesse dado continuidade à classe de fragatas Niterói, não sei onde estaríamos hoje”, observou.
“Agora, nós estamos precisando recomeçar do zero. Submarinos também, recomeçamos do zero. Porta-aviões, começamos e não acabamos. Estou falando da Marinha, mas os problemas existem no Exército e Aeronáutica. Ou seja, a cada 20 anos, nós praticamente recomeçamos do zero. Isso não pode acontecer”.
“Os EUA constroem porta-aviões há 100 anos, a Rússia tem uma família de blindados que ela começou a desenvolver em 1920, e está aí hoje a excelência dos blindados russos na guerra da Ucrânia”, apontou o militar.
“Temos excesso de dependência de insumos estrangeiros críticos, ou seja, o sistema de ejeção de pilotos, por exemplo, só existem três ou quatro empresas que produzem. O Brasil não tem esses explosivos, esses itens, etc. Se nós tivermos um problema, um dia muito provavelmente não nos será fornecido esses itens”, advertiu.
“A Argentina recentemente comprou um lote de aviões da França, só que o fabricante do acento ejetável é britânico. Aí os argentinos ficaram impedidos de voar a aeronave e não sei se já resolveram isso”, relatou.
O ex-militar, que dirige o canal “Artes da Guerra”, no Youtube, com dezenas de milhares de seguidores, alertou também para o fato de que “há muita proliferação de doutrinas da OTAN no Brasil”.
“Acontece que a OTAN já provou na guerra da Ucrânia que as suas doutrinas de contrainsurgência usadas no Afeganistão e outros países, não têm efeito numa guerra de alta intensidade. Nós copiamos muita coisa da OTAN. É preciso rever isso”, disse ele.
“Temos que buscar, sempre que possível, a integração com o chamado Sul Global, de vez que essas nações enfrentam os mesmos desafios que o Brasil”, defendeu. “Nós copiamos muita coisa da OTAN. É preciso rever isso”, disse. “Temos que buscar, sempre que possível, a integração com o chamado Sul Global, de vez que essas nações enfrentam os mesmos desafios que o Brasil”.
“O Irã nos anos 1980 importava tudo dos EUA. Ficou dependente da Operação Irã-Contras para receber suprimentos. O Irã desenvolveu uma indústria militar própria. Hoje ele tem a melhor família de drones e mísseis do Oriente Médio. Mesma coisa aconteceu com a Índia. A África do Sul tinha uma boa indústria de defesa, está boa ainda, mas perdeu muito”.
“O Brasil precisa prospectar soluções e parcerias nesse sentido, porque essas nações têm os mesmos problemas e os mesmos interesses do nosso país e não representam de forma alguma uma ameaça”, considerou.
Ele defendeu ainda a introdução nos currículos militares de tópicos que alertem para as fragilidades do Brasil e para a cobiça que somos alvo. “O tenente lá na base, o sargento lá na base, ele precisa saber que o país dele é alvo. O tenente que sabe que o país dele é alvo, vai ser um general, um almirante ou um brigadeiro nacionalista. Vai brigar pelos interesses nacionais”, destacou o comandante.
Robinson Farinazzo argumentou, por fim, que é necessário ampliar o debate com a sociedade. “É ela quem vai pagar com suas riquezas e seu sangue se nós errarmos. Defesa e soberania precisam entrar na pauta eleitoral”, advertiu.