Andar de ônibus no DF: um custo bilionário

Os gastos anuais vem apresentando sobressaltos. De 2016 até finais de 2020, foram repassados às empresas de ônibus R$ 2,772 bilhões.

Andar de ônibus no DF: um custo bilionário

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Andar de ônibus no DF: um custo bilionário

Data: 25/11/2021Autor: Chico Sant'Anna

Os gastos anuais vem apresentando sobressaltos. De 2016 até finais de 2020, foram repassados às empresas de ônibus R$ 2,772 bilhões. A despesa apontada para 2021, R$ 1.167 bilhão, equivaleria, portanto, a pouco menos da metade do que se gastou em cinco anos, sendo um deles da Pandemia.

Por Chico Sant’Anna

Quanto custa andar de ônibus em Brasília? O baú, com diz a galera.
Em valores redondos, R$ 1,167 bilhão, caso a Câmara Legislativa venha aprovar um pedido de verba suplementar da ordem de R$ 166 milhões, apresentado pelo GDF. Até finais de outubro, segundo dados da secretaria de Mobilidade do DF (Semob), as cinco empresas privadas já haviam recebido do GDF a importância de R$ 981,528 milhões. E essa montanha de dinheiro não representou melhorias para os passageiros, que enfrentam ônibus antigos, superlotados e que muitas vezes quebram no meio do caminho.

Esses valores, segundo o GDF representam a indenização das gratuidades – passe estudantil e portadores de necessidades especiais – e mais a diferença entre o preço pago na catraca e a chamada tarifa técnica. O metrô e a TCB não entram nessa contabilidade.

Tarifa técnica + Subsídios

Os gastos anuais vem apresentando sobressaltos. De 2016 até finais de 2020, foram repassados às empresas de ônibus R$ 2,772 bilhões, segundo levantamento feito pela assessoria econômica do gabinete do distrital Leandro Grass (Rede). A despesa apontada para 2021, R$ 1.167 bilhão, equivaleria, portanto, a pouco menos da metade do que se gastou em cinco anos, sendo um deles da Pandemia.

O GDF remunera as empresas a partir de uma fórmula que combina os gastos das empresas, custos operacionais das empresas, impostos e lucratividade, divididos pelos total de passageiros que passam pela catraca. É essa equação que define a tarifa técnica. Um dos motivos da alta de 2020, foi o reajuste concedido em outubro daquele ano pelo GDF na tarifa técnica paga a todas empresas de ônibus. Só a Pioneira, foi aquinhoada com um reajuste de 65,25%, contra uma inflação no mesmo ano de 9,5%. Em janeiro desse ano, outro aumento foi a ela concedido, 6,6%. Em setembro e novembro desse ano, novos reajustes foram concedidos. Hoje o valor que a Pioneira recebe com base em cada passageiro transportado é de R$ 8,1814. Se ele é pagante, é paga a diferença, se ele possui gratuidade, o valor é integral.

Em tese, o valor que o passageiro deveria pagar na catraca se não houvesse o subsidio oficial. Ela varia de empresa para empresa. A tarifa técnica mais cara em vigor no DF, hoje, é a que beneficia a São José, R$ 10,8936, que opera ônibus nas cidades de Taguatinga e Ceilândia, Brazlândia, SIA, SCIA e Vicente Pires. Em seguida, vem a Urbi, R$ 9,7225, a Marechal, R$ 8,2340, e a Piracicabana, R$ 7,7377.

Para algumas empresas, o GDF chega pagar quase R$ 11,00 por passageiro.

 

As empresas, contudo, alegam desequilíbrio financeiro, devido à queda no volume de passageiros transportados e um maior custo de combustíveis. A tarifa técnica não estaria sendo suficiente para cobrir tudo. Com a Pandemia e a consequente redução de passageiros transportados, o GDF passou a pagar também valores a título de manutenção do equilíbrio financeiro do sistema, informam especialistas em mobilidade.

“Na pandemia, mesmo com menos passageiros circulando, as empresas deveriam ter mantido a frota para evitar aglomeração, mas elas reduziram e os ônibus continuaram lotados mesmo com muita gente em casa. E agora, estão recebendo a remuneração como se não tivessem reduzido a oferta e rodado com ônibus vazio esse tempo todo” – explica um especialista em mobilidade que prefere não se identificar.

Além disso, não há uma efetiva fiscalização de quantos ônibus estão circulando e com quantos passageiros e a que custo real. A obrigação de todos os ônibus serem dotados de GPS, para permitir a fiscalização, não foi obedecida. “Hoje, simplesmente as empresas dizem que fizeram tantas viagens e recebem a remuneração com base nessa informação, mas na realidade elas fizeram a metade e ninguém confere” – complementa.

A falta de transparência é levantada pelo distrital Leandro Grass. “A gente não tem acesso ao sistema de bilhetagem, não há auditoria. Sempre é um repasse duvidoso, no escuro e zero de transparência” – analisa. “O que nos espanta também, além do fato de este ser o quarto pedido de aumento em seis meses, é que sempre quando esse tipo de projeto chega à Câmara, ele não vem acompanhado da devida justificativa. O que se informa é tão somente a necessidade de manter o equilíbrio econômico do contrato. Quando analisamos, no entanto, as planilhas, essa necessidade não fica clara.” – comenta a distrital Julia Lucy (Novo).

O Ministério Público, por meio das Promotorias de Justiça de Defesa do Patrimônio Público Social (Prodep), abriu inquéritos para apurar a eventual irregularidade nas portarias editadas pela Semob desde 2019 – início do governo Ibaneis Rocha (MDB), reajustando a tarifa técnica. A suspeita é que elas são editadas apenas para dar justificativa aos pedidos de suplementação de verbas ao Legislativo.

Publicado simultaneamente na coluna Brasília, por Chico Sant'Anna, no semanário Brasília Capital.

Fretamento

Para o ex-secretário adjunto de mobilidade, Leandro Couto, que atuou no governo Rollemberg, é necessária uma revisão dos contratos, alteração na organização institucional do setor e adoção de medidas mais estruturantes.

O modelo de contratação das empresas de ônibus pelo GDF foi definido na gestão de Agnelo Queiroz. A justiça já impugnou os contratos, mas as empresas operam sob a proteção de uma liminar. Na avaliação de Paíque Duque Lima, do Movimento Passe Livre, o melhor para o Estado e, consequentemente, para o contribuinte, seria um modelo de “fretamento”. As empresas seriam remuneradas pelas viagens e quilometragens realizadas. Independentemente da quantidade ou perfil de passageiros transportados.

Com isso, as gratuidades deixariam de ser indenizadas à parte. Toda receita iria para um fundo, que poderia se beneficiar de receitas paralelas, tais como propaganda nos ônibus e paradas, além de rendimentos imobiliários, tais como a locação de lojas, salas e bancas nos terminais rodoviários, e até mesmo, como ocorre em outros Estados, a renda de estacionamentos pagos.

Esse é um modelo que numa segunda etapa até viabilizaria a reivindicação de Passe Livre. Gratuidade que já se faz presente em cidades, como Caucaia, na região metropolitana de Fortaleza, Ceará.

A batata quente estão na CLDF, a um ano das eleições. “Hoje, tanto o Estado quanto a população ficam na mão das empresas. A CLDF é apenas uma peça útil nessa engrenagem, que aproveita essas votações para tirar mais vantagem do governo. O que farão os distritais? Votar contra, parar o sistema?” – conclui Leandro Couto.