Pochmann explica a crise econômica: “Governo gerou um ciclo vicioso”
Segundo o economista, queda na renda afeta o consumo, que gera redução da produção, que provoca desemprego, que faz a renda cair. Brasil só escapará desse redemoinho com investimentos do Estado
Pochmann explica a crise econômica: “Governo gerou um ciclo vicioso”
Segundo o economista, queda na renda afeta o consumo, que gera redução da produção, que provoca desemprego, que faz a renda cair. Brasil só escapará desse redemoinho com investimentos do Estado
Divulgação
Pochmann: "Não tem saída se não voltarmos a fortalecer o mercado interno por meio de mais distribuição de renda"
A semana se encerra com uma série de notícias negativas na economia. Depois de, na terça-feira (30), a revisão dos dados do Caged mostrarem que o governo de Jair Bolsonaro vinha mentindo sobre a criação de empregos em 2020, e o IBGE revelar que a renda média do trabalhador caiu pelo quarto trimestre seguido, a quinta-feira (2) trouxe outro dado assustador: após mais um recuo do PIB, o Brasil entrou em recessão técnica.
Em entrevista à TvPT, nesta sexta-feira (3), o economista e presidente do Instituto Lula, Márcio Pochmann, explicou como todos esses dados estão relacionados e por que é possível responsabilizar a política econômica de Bolsonaro e seu ministro da Economia, Paulo Guedes, por um quadro tão caótico.
De acordo com o especialista, os dados mostram que o Brasil vive um ciclo vicioso, em que falta de emprego, queda na renda e redução do PIB alimentam um ao outro. “Como a renda dos trabalhadores está encolhendo, não tem consumo. Com consumo menor, não tem produção. Se a produção não cresce, não tem emprego. (…) Como há mais pessoas competindo pelo mesmo emprego, isso rebaixa a taxa de salários (queda na renda)”, afirmou (assista abaixo a íntegra da entrevista).
O mais preocupante, acrescentou Pochmann, é que o país não deve encontrar uma saída para esse quadro caótico enquanto durar o governo Bolsonaro. Isso porque o atual presidente e seu ministro se recusam a usar o Estado para fazer com que a economia escape desse redemoinho.
“Infelizmente, o país não tem sinal de saída desse quadro porque a opção do governo passa pelo pressuposto de que os problemas do Brasil se devem ao Estado, que seria corrupto, incompetente, gastador. Portanto, as ações têm sido no sentido de reduzir o Estado, acreditando que a iniciativa privada possa, por si só, fazer a retomada da economia. Esse discurso já vem desde o golpe de 2016 e até agora não apresentou resultados favoráveis. E não acredito que apresentará”, advertiu.
Pochmann lembrou que, durante os governos Lula e Dilma, foi o fortalecimento do Estado e de sua capacidade de estimular a economia e a distribuição de renda, para aquecer o mercado interno, que permitiram a economia brasileira alcançar o posto de sexta maior do mundo e o índice de desemprego ser reduzido a menos de 5%. No entanto, o governo Bolsonaro faz exatamente o contrário: enfraquece o Estado e, quando toma alguma decisão, não estimula a economia, mas piora a situação.
Prova disso é a política de preços adotada atualmente na Petrobras, que repassa para o consumidor as altas dos combustíveis no mercado internacional, mesmo que a gasolina, o diesel e o gás sejam produzidos internamente. O resultado é o aumento da inflação, uma vez que a maior parte da produção no Brasil é transportada nas rodovias. “Temos hoje uma inflação provocada não pelo aumento do consumo, mas porque há um choque no custo da produção”, observou.
É possível recuperar os empregos perdidos
Pochmann disse que o Brasil pode voltar a gerar empregos se abandonar a política praticada por Guedes e Bolsonaro. Para isso, o governo precisa voltar a distribuir renda, seja por meio de programas sociais, seja pela valorização do salário mínimo, e retomar os investimentos, tornando-se um indutor do crescimento. Foi o que fizeram os governos Lula e Dilma.
“Nos governos do PT, o Estado era visto não como o centro do problema, mas como uma parte da solução. Tínhamos um conjunto de iniciativas que partia do pressuposto que o grande ativo do Brasil é seu mercado interno, seu mercado consumidor. E, para que esse ativo fosse aproveitado, era necessária a distribuição de renda. População com mais renda é uma população que consome mais e, ao consumir mais, ela estimula a produção. Estimulando a produção, aumenta o emprego. Era um ciclo virtuoso”, resumiu.
De acordo com o economista, não há saída para o Brasil se não voltarmos a fortalecer o mercado interno. “Os empregos poderão reaparecer se nós voltarmos a crescer. Uma forma é substituir parte do que importamos por produção interna e estimular, ao mesmo tempo, vários setores econômicos, seja a infraestrutura, seja a indústria vinculada à cadeia de petróleo e gás, o complexo da saúde… Enfim, o Brasil tem uma série de possibilidades de voltar a crescer e gerar emprego.”
Para o presidente do Instituto Lula, essa primeira medida resolveria o problema emergencial do desemprego, dando ao país tempo para se preparar para as transformações que o mercado de trabalho certamente sofrerá com as mudanças tecnológicas já em andamento. “Obviamente, a partir disso, precisamos repensar uma nova forma de organização das ocupações, tendo em vista as inovações tecnológicas que estão em curso”, antecipou.