Aniversário Luís Carlos Prestes: vida e obra do cavaleiro da esperança

Neste dia 3 de janeiro de 2022, ocorre a passagem dos 124 anos de nascimento de Luís Carlos Prestes. Sua entrada na cena política se deu com a lendária Coluna que tem seu nome como emblema, um dos mais marcantes acontecimentos da história do Brasil.

Aniversário Luís Carlos Prestes: vida e obra do cavaleiro da esperança

Aniversário Luís Carlos Prestes: vida e obra do cavaleiro da esperança

 3 de janeiro, 2022

  

O militante Luís Carlos Prestes

Expoente da segunda geração de dirigentes do Partido Comunista do Brasil, Prestes é justamente considerado um dos principais personagens da história do movimento comunista.

Por Osvaldo Bertolino

Neste dia 3 de janeiro de 2022, ocorre a passagem dos 124 anos de nascimento de Luís Carlos Prestes. Sua entrada na cena política se deu com a lendária Coluna que tem seu nome como emblema, um dos mais marcantes acontecimentos da história do Brasil. A Coluna Prestes percorreu o Brasil no final da década de 1920 combatendo os desmandos da República Velha e fermentando as condições para a Revolução de 1930, liderada por Getúlio Vargas.

Em dezembro de 1927, o então secretário-geral do Partido Comunista do Brasil, Astrojildo Pereira, foi enviado para encontrar-se com ele em seu exílio na Bolívia. Deixou livros marxistas e falou dos planos dos comunistas. Um ano e meio depois, a delegação que representou o PCB na “I Conferência latino-americana dos partidos comunistas” em Buenos Aires fez uma série de contatos com Prestes, abrigado na cidade depois de se internar com a Coluna na Bolívia, para convencê-lo a ser o candidato do PCB a presidente da República em 1930.

Adepto da ideia de que o Brasil precisava passar por reformas estruturais, também fora consultado por Vargas para acompanhá-lo nos preparativos da Revolução. No final das contas, optou por um caminho próprio e no começo de 1930 lançou o célebre Manifesto de Maio — no qual defendeu um governo baseado nos conselhos de trabalhadores da cidade e do campo, soldados e marinheiros — e criou a Liga de Ação Revolucionária. Só iria se integrar ao Partido Comunista do Brasil em agosto de 1934, quando estava na União Soviética, por influência da Internacional Comunista.

Uma publicação de outubro de 1934, chamada Sentinela Vermelha — com um post scriptum dizendo que a reprodução era obrigatória e imediata a todas as bases para ampla discussão, com retorno urgente para o Partido da opinião de cada organismo — informava que o Birô Político havia discutido amplamente a proposta da Internacional Comunista de adesão de Prestes às fileiras do PCB. Segundo o Sentinela Vermelha, Prestes deixara de ser um “caudilho pequeno-burguês” e passara “a confiar nas forças do proletariado como única classe revolucionária e no seu Partido, o PC”. Reconhecera “em vários documentos escritos todo o seu passado de erros” e vinha “demonstrando na prática a sua dedicação à causa revolucionária”.

Prestes desembarcou clandestinamente no Brasil em 15 de abril de 1935, vindo da União Soviética, onde estava exilado, para liderar o Levante daquele ano, já ocupando o posto de presidente de honra da Aliança Nacional Libertadora (ANL), indicado durante o primeiro comício realizado em 30 de março daquele ano. A decisão fora tomada pelo Comitê Executivo Nacional da ANL, que se reuniu pela primeira vez em 12 de março. Não demorou e ondas de povo acorreram à organização, vista como algo novo, um caminho por onde poderiam canalizar seus anseios. Chegavam de forma espontânea, atraídas pelas narrativas que davam conta do Cavaleiro da Esperança – como ficou conhecido – novamente disposto a mudar a face do Brasil.

Os atos da ANL arrastavam multidões, que se apinhavam para ouvir que ele estava iniciando uma nova jornada de lutas. Em um deles, dia 5 de julho de 1935 — aniversário dos levantes dos tenentes de 1922 e de 1924 —, um Manifesto de sua autoria foi lido pelo eloquente Carlos Lacerda, na sede da ANL. As palavras contagiaram o coração dos presentes e se propagaram como descarga elétrica. Foram palavras duras. Num dos trechos, o Manifesto dizia que no país de um lado estavam os libertadores e de outro os traidores “a serviço do imperialismo”. Aquele era o momento do assalto ao poder porque o Brasil vivia uma situação de guerra. “Cada um deve ocupar o seu posto”, disse Prestes.

O governo Vargas reagiu banindo a ANL da legalidade e, após o malogro do Levante de novembro, desencadeou uma violenta onda repressiva. Prestes foi preso em 5 de março de 1936, depois de uma caçada comandada pelo chefe da polícia política, Filinto Müller, que esquadrinhou o bairro do Méier e revistou casa por casa. Estava com a esposa, a alemã Olga Benário, que foi deportada grávida para o país nazista e morreu, pouco depois de dar à luz Anita Leocádia Benário Prestes, em uma câmara de gás na cidade de Bernburg.

Com a reviravolta na Segunda Mundial, quando os soviéticos começaram a empurrar os nazistas de volta para Berlim, Vargas se aproximou dos Aliados e recebeu o devido reconhecimento dos comunistas. O presidente se afastava do grupo mais identificado com o fascismo e, consequentemente, se aproximava do PCB. O diplomata Orlando Leite Ribeiro foi designado por Vargas para ser o elo com Prestes, ainda encarcerado. Tempos depois, Prestes avaliaria que o presidente precisava dos comunistas, uma força política com grande apoio popular.

Em carta a Agildo Barata em 22 de junho de 1942, Prestes disse não estar mais preocupado com seu antigo temor de que “os imperialistas quisessem fazer do nosso povo carne de canhão”. “Hoje, ao contrário, sou de opinião que só pelo sacrifício voluntário do sangue de nosso povo, pela participação ativa na luta dos povos antifascistas, onde for necessário, em qualquer parte do mundo, salvaremos nossas cidades da destruição e evitaremos o massacre de mulheres e crianças, para não falar da ignomínia que seria permitir, por omissão, a organização em nossa pátria de bases nazistas para o ataque ao povo americano”, asseverou.

Escreveu artigos publicados em jornais como O Globo e Jornal do Comércio defendendo esse ponto de vista. Prestes também entregou uma mensagem ao comunista cubano Blas Rocas, em julho de 1942, que o visitara na prisão, dizendo que, a despeito dos sofrimentos, não estava disposto a viver em recolhimento pessoal. Considerava seu dever, e dos verdadeiros patriotas brasileiros, cessar todas as disputas de caráter interno e unir esforços para acelerar a derrocada das potências do Eixo nazifascista.

Era uma posição que convergia para os encaminhamentos da Comissão Nacional Provisória (CNOP), criada para reorganizar o Partido Comunista do Brasil. A nova fase dos comunistas ganhou forma na II Conferência do PCB — a Conferência da Mantiqueira —, realizada em 1943. Nela, Prestes foi eleito secretário-geral, mas só assumiria de fato dois anos depois, no final do “Pleno da Vitória”, como ficou conhecida a primeira reunião legal da direção nacional depois de vinte e três anos de vida clandestina, realizada entre 7 e 12 de agosto de 1945.

Logo após o estabelecimento de relações diplomáticas do Brasil com a União Soviética, em 2 de abril de 1945, Prestes telegrafou a Vargas cumprimentando-o e cobrando anistia aos presos políticos. A União Soviética era, naquele momento, referência para os comunistas brasileiros, segundo disse João Amazonas num ato de comemoração do 28º aniversário da Revolução Russa, na noite de 7 de novembro de 1945.

Ali estava se comemorando uma data muito cara ao coração de todos os trabalhadores de todo o mundo e à humanidade em geral, afirmou. Segundo ele, o Partido “sempre a comemorara, nos heroicos anos da ilegalidade, e os comunistas jamais deixaram de render homenagem à grande data mesmo quando se achavam lançados pela reação fascista nas suas imundas cadeias”.

Amazonas lembrou que a reação fascista escolhera justamente o dia 7 de novembro, aniversário da Revolução, para conduzir Prestes brutalmente ao nefasto Tribunal de Segurança Nacional, em 1940. “Mas Luís Carlos Prestes reafirmou-se na sua grandeza: perante o nefasto Tribunal, saudou os imortais povos soviéticos, prestou sentida e profunda homenagem à Revolução Socialista, dando-nos, assim, com sua corajosa atitude, um exemplo que jamais será esquecido e que os comunistas sempre terão presente em sua luta contra o nazifascismo, pela democracia, progresso e bem-estar da pátria e do povo brasileiros”, discursou.

No mesmo dia em que presidente concedeu anistia aos presos e exilados, em 18 de abril de 1945, Prestes deixou a prisão. Uma comitiva composta pelos principais dirigentes do PCB o acompanhou até a casa do dirigente comunista Leôncio Basbaum, no bairro da Lagoa, onde ficaria confinado por de dez meses — um zelo necessário diante de eventuais ameaças à sua vida. Em 23 de maio, liderou o comício realizado no estádio de São Januário, no Rio de Janeiro. As versões dão conta de cem mil pessoas presentes, que ouviram o novo líder máximo do PCB falar em união nacional, ordem e democracia.

Prestes magnetizava não só os brasileiros. Na América Latina, da Argentina ao México, seu nome era pronunciado nas manifestações populares e levantava multidões. Em Cuba, sua vida foi tema de uma história de rádio. Nos Estados Unidos, festivais poéticos mencionavam sua heroica batalha antifascista. Quando esteve preso, intelectuais, sindicalistas e lideranças políticas daquele país se mobilizaram para pedir sua libertação. Alguns dias depois de anunciado o “Grande Comício Luís Carlos Prestes” no Rio de Janeiro ele recebeu uma mensagem de figuras de projeção mundial residentes nos Estados Unidos.

Assinaram o documento, entre outros, Charlie Chaplin (ator e diretor de cinema norte-americano), Theodore Dreiser (escritor norte-americano), Lion Feuchtwanger (escritor alemão), Thomas Mann (romancista alemão), Walter Dill Scott (professor de psicologia norte-americano), Groucho Marx (ator norte-americano), Frederic March (ator norte-americano), Pierre Van Piaasen (jornalista holandês-canadense-americano), Elliot Paul (escritor norte-americano), além de arcebispos, bispos, rabinos, magistrados, professores, pintores e cientistas. “Enviamos nossas mais calorosas saudações ao grande brasileiro Luís Carlos Prestes, e por seu intermédio aos demais antifascistas libertados. A anistia é a verdadeira expressão democrática da vontade do povo brasileiro”, dizia a mensagem.

No discurso, Prestes disse que o Rio de Janeiro festejava a primeira grande vitória da democracia no Brasil. A anistia fora, “sem sombra de dúvida, uma conquista do povo — de homens, mulheres e crianças unidos pelo coração num sentimento que se tornou paixão, numa ideia que se fez força”. Em uma passagem enfatizou sua condição de comunista. “Sabeis, cariocas e brasileiros, que sou comunista. O Partido Comunista do Brasil é o meu Partido. Foi ele o organizador e dirigente do glorioso movimento da Aliança Nacional Libertadora — frente única dos patriotas e democratas que em todo o Brasil se uniram para impedir a fascistização de nossa terra”, falou.

Segundo Prestes, dez anos de guerra e perseguições contra o comunismo fizeram do povo brasileiro o mais comunista da América. “É o que tinha de ser. Comunista para o nosso povo é aquele que de maneira mais firme e consequente luta contra o estado de coisas intoleráveis e injustas predominante em nossa terra; comunista é o que quer a negação disso que aí temos, a negação da miséria e da fome, a negação do atraso e do analfabetismo, a negação da tuberculose e do impaludismo, a negação do barracão e do trabalho de enxada de sol a sol nas fazendas do senhor, a negação da censura à imprensa e das limitações de toda ordem às liberdades civis, a negação enfim da exploração do homem pelo homem”, discursou.

No dia 15 de junho de 1945, Prestes mobilizou outra multidão, desta vez para o Comício “São Paulo a Luís Carlos Prestes”, realizado no estádio do Pacaembu. O Partido levou grupos organizados, portando faixas e sustentando palavras de ordem. E havia um convidado especialíssimo, o grande poeta chileno e comunista recém-eleito senador, Pablo Neruda, que leu seu poema dedicado a Prestes intitulado Dito no Pacaembu. “Este comício supera todas as manifestações a que eu havia assistido, em qualquer parte do mundo”, disse ele. Recordava as gigantescas mobilizações das frentes populares que vira na Espanha e na França às vésperas da Segunda Guerra Mundial.

Participaram também personalidades como o general Miguel Costa, que com Prestes dirigiu a Coluna – também chamada de Coluna Miguel Costa-Prestes. Monteiro Lobato, adoentado e repousando em casa, leu, por telefone, uma mensagem a Prestes. “Tenho como dever saudar Luís Carlos Prestes porque sinceramente vejo nele uma grande esperança para o Brasil. Vejo nele um homem nitidamente marcado pelo destino. Vejo nele o único dos nossos homens que pelos seus atos e pelo amor ao próximo conseguiu elevar-se à altura de símbolo. Símbolo do quê? De uma mudança social”, afirmou.

Falando no encerramento do “Pleno da Vitória!”, Prestes evocou os horrores do fascismo, mostrando como foi importante a colaboração das demais potências com a União Soviética, que teve como consequência no Brasil a politização do povo, um fator importante na luta pelo afastamento dos fascistas de posições-chave do governo. Naquele momento em que os comunistas saíam para a vida legal – ao ar puro da livre discussão, ao sol meridiano da crítica e da autocrítica, disse Prestes –, os comunistas deveriam ter em conta a importância do Brasil no continente e no mundo.

O país se destacava por sua grandeza geográfica, por suas riquezas potenciais, por sua importância política como fator decisivo na luta pela consolidação da paz no período de desenvolvimento pacífico daquele pós-guerra. “Não é atitude patrioteira afirmar que o Brasil pode ser colocado ao lado das grandes potências do mundo. Se nos anos de 1937 a 1942 tivéssemos seguido outro caminho, se os aliancistas não tivessem sido derrotados em 1935, outra seria nossa situação hoje, e poderíamos estar ocupando o lugar de sexta potência, ao lado da União Soviética, dos Estados Unidos, da China, da Inglaterra e da França”, afirmou.

Aquelas grandes mobilizações eram a arrancada para a campanha vitoriosa dos comunistas pela convocação da Assembleia Nacional Constituinte. A eleição dos constituintes ocorreu em 2 de dezembro de 1945, quando também foi eleito o presidente da República. Compareceram às urnas cerca de seis milhões de eleitores. O candidato a presidente do PCB, Yeddo Fiúza, obteve 569.818 votos, 9,7% do total de votantes. O general Eurico Gaspar Dutra, do Partido Social Democrático (PSD), foi eleito com 55% dos votos e Eduardo Gomes, da UDN, obteve 35%. Os comunistas elegeram catorze deputados federais e um senador (Prestes).

No começo da tarde da sexta-feira 1º de fevereiro de 1946, Prestes, liderando a bancada do Partido Comunista do Brasil, entrou no Palácio Tiradentes, no Rio de Janeiro, para tomar posse. Trajava terno azul e demonstrava sinais de nervosismo. Após a sessão de instalação, ele e a bancada do PCB dirigiram-se ao monumento a Tiradentes ao pé da escadaria do edifício da Constituinte para pôr no local uma coroa de flores com os seguintes dizeres: “A Tiradentes, herói da Independência. A bancada do Partido Comunista do Brasil.” Fez um breve discurso, relembrando a luta dos brasileiros por independência e democracia, bandeira pela qual, afirmou, muitos integrantes da Força Expedicionária Brasileira (FEB) também deram a vida, combatendo o nazifascismo na Europa.

As perseguições anticomunistas, no entanto, começaram já no início de 1946, quando dois pedidos de cassação do registro eleitoral do PCB foram apresentados ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Um incluía numerosas publicações de jornais e de entrevistas pretendendo provar que o Partido era uma organização orientada pelo “comunismo marxista-leninista internacional” e outra afirmava que, logo depois de registrado, em 10 de novembro de 1945, o PCB havia passado a exercer “ação nefasta” insuflando luta de classes, greves, confusão e desordem.

A cassação se consumou em 7 de maio de 1947. Não demorou e a artilharia da direita mirou os mandatos comunistas, cassados em 8 de janeiro de 1948. Depois da votação, a bancada comunista subiu nas poltronas e, de pé, com o braço esquerdo levantado e a mão fechada, brandiu: “Viva o Partido Comunista do Brasil! Viva Prestes! Viva o proletariado! Nós voltaremos!” Pedro Pomar e Diógenes Arruda Câmara, eleitos pelo Partido Social progressista (PSP), permaneceram na Câmara dos Deputados.

Pomar denunciou que o Brasil estava tão envolvido no clima anticomunista que o governo perseguia a irmã e a filha de Prestes, obrigando-as a deixar o país. Ele relembrou o episódio da entrega de Olga Benário à Gestapo por Vargas e Filinto Müller e falou do recuo do chefe do Estado Novo em 1945 para concluir que as forças do fascismo se agruparam em torno de Dutra. Depois da cassação dos mandatos, disse, Prestes era vítima de novas perseguições — bandos policiais estavam à sua caça por toda parte e sua filha, uma criança (Anita Leocádia Prestes), não era deixada em paz.

O diretor do colégio onde a filha de Prestes estudava foi chamado e coagido a expulsá-la. “Agora, Anita Leocádia Prestes viu-se obrigada a deixar o país, em vista da situação em que nos encontramos”, protestou. Segundo Pomar, a filha de Prestes corria o risco de ser presa como refém. “Isso fez com que suas tias providenciassem sua saída para o estrangeiro, a salva da sanha assassina das feras de Truman, das quais nos diz Prestes que são piores do que as feras de Hitler”, afirmou.

Os acontecimentos no Brasil, disse Pomar em artigo no jornal Voz Operária de 3 de janeiro de 1952 intitulado Saudemos Prestes, um chefe à altura de sua missão — uma reverência à passagem do seu 54º aniversário —, exigia um forte Partido Comunista, “armado com a teoria marxista”. Mesmo o PCB não apoiando Vargas eleito em 1950, Prestes disse que a mobilização popular surgida logo após seu suicídio, em 1954, revelara que a real força do povo brasileiro, que estaria disposto a defender a liberdade e a independência da pátria, vertebrada pelos comunistas e trabalhistas.

Os acontecimentos colocaram ambos no mesmo terreno de luta. “Trabalhistas e comunistas lutamos contra o mesmo inimigo, que é o imperialismo norte-americano, lutamos contra seus agentes em nosso país — os generais fascistas e os politiqueiros reacionários da UDN”, disse. Seria uma união contra os entreguistas, que deveriam ser derrotados nas urnas ainda em 1954, quando o país elegeria representantes para o Congresso Nacional, assembleias legislativas, câmaras de vereadores, além de alguns governadores e prefeitos.

Em março de 1955, um Pleno Ampliado do Comitê Central aprovou um Informe de Prestes orientando os comunistas a desenvolverem intensa mobilização para a vitória eleitoral “da causa do nosso povo”, com o título As eleições presidenciais de 1955 e as tarefas do nosso Partido. “Não por acaso, a sucessão presidencial, ao longo da nossa história republicana, tem se transformado repetidamente em movimento político de massas, tem constituído importante elemento mobilizador das mais amplas camadas da população do país e servido de fermento para violentos choques de classes. Assim foi em 1922, em 1930, em 1937 e, mais recentemente, em 1945”, disse.

O caminho para o PCB, segundo Prestes, seria apoiar o candidato em torno do qual fosse possível a organização da mais ampla frente democrática em defesa da Constituição. O nome era o de Juscelino Kubitscheck. O martelo foi batido em uma reunião com a ala esquerda do PTB que varou a noite de 19 para 20 de julho de 1955, com o PCB representado por Pomar e Arruda.

A posição dos comunistas foi oficializada no Pleno Ampliado do Comitê Central realizado entre 9, e 11 de agosto de 1955, quando Prestes apresentou o Informe intitulado A posição do Partido na sucessão presidencial e nossas tarefas atuais. O texto alertava para o perigo de um golpe de Estado ou militar e considerava de decisiva importância a criação de uma poderosa coalizão de forças políticas para isolar e derrotar os golpistas. O Comitê Central decidiu indicar ao eleitorado também o nome de João Goulart para o cargo de vice-presidente da República.

Nos debates desencadeados após o XX Congresso do Partido Comunista da União Soviética (PCUS), em 1956, Prestes assumiu a defesa do Partido Comunista do Brasil. “Um grupo divisionista, embora tenha conseguido durante algum tempo utilizar-se dos principais órgãos de imprensa do Partido para difundir suas opiniões contra a linha do Partido e para atacar a direção do Partido, não pôde enganar como desejava os militantes do Partido, chocou-se com o invencível sentido de unidade, essência do amor ao Partido e do espírito de Partido que, como comprovam os fatos, já estão fortemente enraizados em nossas fileiras”, disse em entrevista à Voz Operária de 27 de julho de 1957. Em 24 de novembro de 1956, o jornal do Partido havia publicado uma carta de Prestes recomendando que a discussão fosse baseada em princípios.

Naquele clima carregado, Pomar foi o orador da comemoração do 60º aniversário de Prestes na noite de 3 de janeiro de 1958, na sede do jornal Notícias de Hoje, em São Paulo. A festa reuniu amigos, camaradas e admiradores do líder máximo do PCB. Pomar destacou o papel e a importância de Prestes na luta do povo brasileiro pela sua independência, progresso e bem-estar.

Os dirigentes comunistas viviam na semilegalidade. Em 9 de outubro de 1957, Prestes compareceu à audiência na 9ª Vara Criminal do Rio de Janeiro para prestar esclarecimentos ao juiz João Fontes Faria, que acatara a denúncia do promotor Roberto Mariano também contra Maurício Grabois, João Amazonas, Pedro Pomar e mais dezesseis dirigentes do Partido — além de oito jornalistas do jornal comunista Imprensa Popular. A denúncia decorria da publicação do Projeto de Estatutos do Partido, pleiteando sua legalidade.

Enquanto isso, o frenético desdobramento das novas contradições que cresciam rapidamente no Partido agitava os comunistas. As notícias davam conta de que logo seriam absolvidos — Prestes estava com prisão preventiva decretada —, um alívio para o PCB enfrentar a crise desencadeada pelo XX Congresso do PCUS com mais segurança.

Em 1960, foram absolvidos. “Os acusados não negaram sua condição de comunistas, porém isso não é crime porque a Constituição assegura o direito de livre pensamento de ideia política ou religiosa. A hipótese de tentativa de mudança da ordem política e social ou a de subvenção desta mesma ordem para estabelecer ditadura de classe ou de grupo não ficou provada”, disse o juiz na sentença.

No “racha” do V Congresso, em 1960, Prestes liderou o grupo do Partido Comunista Brasileiro, enquanto Amazonas, Grabois e Pomar lideram a reorganização do Partido Comunista do Brasil, que passaria a adotar a sigla PCdoB. Prestes, perseguido pela ditadura militar de 1964, exilou-se com a família na União Soviética e retornaria ao Brasil após a anistia de 1979. Deixou o PCB e ingressou no Partido Democrático Trabalhista (PDT), criado por Leonel Brizola, do qual foi presidente de honra. Faleceu em 7 de março de 1990.

Em 22 de maio de 2013, o Senado aprovou, por unanimidade, projeto de autoria do senador Inácio Arruda (PCdoB-CE) devolvendo simbolicamente o mandato de Prestes – e de seu suplente, Abel Chermont –, cassado em 1948. “Estamos realizando um reparo histórico de uma injustiça, de um ato arbitrário perpetrado contra a democracia no passado. Estamos tirando uma mácula desta Casa”, afirmou Inácio.

O documento PCdoB: 90 anos em defesa do Brasil, da democracia e do socialismo registra que “a partir de 1941 foi sendo forjado um segundo núcleo dirigente mais estável que, mesmo com divergências e alterações, conduziria a legenda até 1956”, do qual Prestes se realça como “grande liderança popular cujo heroísmo da Coluna Invicta, grande feito do tenentismo, lhe deu o título de Cavaleiro da Esperança”. “Ele agregou prestígio e autoridade ao Partido, dentro e fora do país.”

Sua esposa, Maria Prestes, continuou na luta pelo socialismo. Em 2014, a Fundação Maurício Grabois produziu um documentário em vídeo e livro sobre sua passagem pelo trajeto da Coluna Prestes no Rio Grande do Sul, acompanhada dos filhos do casal Mariana e Luís Carlos. A família esteve acompanhada dos jornalistas Osvaldo Bertolino e Cezar Xavier, responsáveis pelo registro da jornada em texto, áudio, foto e vídeo.

O então deputado estadual Raul Carrion (PCdoB-RS), presidente da Grabois no estado, se esmerou na confecção meticulosa da agenda, mantendo parte de sua assessoria disponível para o bom andamento da diversificada programação, apoiada pelo Sindicato dos Metalúrgicos de Caxias do Sul. Por onde passava, Carrion entregava um mapa da Coluna – produzido pelo jornalista e artista gráfico Bernardo Joffily e distribuído pela Fundação Maurício Grabois – a entidades e instituições.