Trabalhistas buscam recriar PTB no RN: “falta um partido ideológico”

Trabalhistas buscam recriar PTB no RN: “falta um partido ideológico”

Trabalhistas buscam recriar PTB no RN: “falta um partido ideológico”

Valcidney Soares

Trabalhistas buscam recriar PTB no RN: “falta um partido ideológico”

Partido precisa obter cerca de 547 mil assinaturas para ser legalizado pelo

 

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Sigla histórica que abrigou nomes como Leonel Brizola, João Goulart e Getúlio Vargas, o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) está em processo de refundação. O último ciclo da legenda chegou ao fim em 2023 depois de ser comandado por décadas por Roberto Jefferson e ter aderido ao bolsonarismo. Agora, a busca dos trabalhistas é de firmar o partido novamente no campo progressista.

No Rio Grande do Norte, um dos responsáveis pela reorganização dos trabalhistas é Marco Antônio dos Santos Silva, de 54 anos, que militou por mais de 20 anos no PT e recentemente estava no PCdoB, “sempre procurando me envolver com o sistema partidário, porque é quem organiza e estrutura a política”, diz.

A meta dos apoiadores do partido é reunir as cerca de 547 mil assinaturas até o final do ano, para estar apto a disputar as eleições de 2026. A direção nacional ainda não sabe quantos apoios têm até o momento, porque ainda não foi feita a consolidação dos documentos nos cartórios. 

“Mas está bem avançado. A expectativa é, no máximo até outubro, atingir as 547 mil assinaturas”, diz Marco Antônio.

No Rio Grande do Norte, a meta é contribuir com cerca de 20 mil assinaturas, mas a coleta no estado ainda está em estágio embrionário. O partido quer definir um esforço concentrado em alguns municípios para atingir o quantitativo esperado. 

“A expectativa nossa é, durante dois ou três meses, avançarmos fortemente. A gente estava fazendo outro tipo de discussão, reunindo para a criação da comissão provisória. Ficamos acompanhando os debates que estão tendo com o núcleo nacional. Então aqui especificamente e em outros estados nós temos a comissão provisória, mas não fizemos ainda um esforço contemplado, um foco específico, nessa questão de arregimentar as assinaturas. Mas aí a gente tem expectativa, sim, aqui também de contribuir e chegarmos até setembro tendo cumprido essas 20 mil assinaturas”, explica.

Entre os que reivindicam o PTB no Rio Grande do Norte, estão cerca de 20 pessoas no momento — alguns que ainda estão no PT e com experiência no movimento sindical, diz Marco Antônio.

“Nós temos umas duas dezenas de pessoas envolvidas nessa primeira discussão, que é uma discussão mais de forma estruturante, para depois caminhar, por exemplo, para o primeiro desafio, que é uma atividade prática de colher as assinaturas e depois, com a formalização do partido, sairmos criando os diretórios no maior número possível de municípios do estado”, aponta.

“Falta um partido ideológico”, diz trabalhista

Para Marco Antônio, formado em Jornalismo e funcionário dos Correios há mais de 27 anos, há uma fragmentação da dimensão ideológica no Brasil. Tendo passado por PT e PCdoB, diz manter respeito às duas siglas, mas atesta suas diferenças.

“Há uma fragmentação da dimensão ideológica. Não temos propriamente partido ideológico no país. O PT é um partido respeitável — passei muito tempo lá, tenho grandes amigos lá —, mas é uma federação de interesses, uma federação de concepções da política. O PCdoB é um partido que tem uma relativa unidade do ponto de vista do entendimento, mas não tem densidade eleitoral”, aponta.

Em relação ao governo Lula, Marco Antônio o enxerga como uma gestão que “busca minimamente arrumar o grande estrago causado por Temer e Bolsonaro”.

“O Estado foi desmobilizado [nos governos anteriores]. No governo Temer foi feita a reforma trabalhista, que tirou direitos essenciais, reforma previdenciária logo em seguida. Agora, [o governo Lula] é um governo que tem pouca margem de manobra. Refém, inclusive, do sistema financeiro”, acredita.

“Lula é um homem que não tensiona com o sistema financeiro, o que Brizola faria, o que Getúlio faria, o que Jango fez, com muita naturalidade, emparedaria o sistema financeiro. Você acha que Brizola, como chefe de Estado, ia permitir que o Brasil tivesse, em termos relativos, a maior taxa de juros do mundo? Claro que não. Há condições para fazer isso? Há. Mas Lula não é um homem de conflito. E o Brizola tensionaria a ponto de impedir essa indecência. Falta ao Brasil um homem com o espírito, um homem destemido, uma alma desabrida que tensione contra essa vagabundagem do sistema financeiro, de rentistas. É por isso que aumenta a desigualdade social”, diz ele, que também não poupa as críticas à extrema-direita.

“É claro que não dá para comparar com a loucura que foi o projeto reacionário de Bolsonaro, um projeto que flerta com o fascismo mesmo. Bolsonaro é um homem assumidamente misógino, homofóbico, mas não só ele. A questão não é o Bolsonaro, a questão são os bolsonaristas, porque têm milhões que seguem ele”, afirma o brizolista, que vê a direita à serviço do mercado financeiro.

“Quando se sente que está perdendo a rédea, o sistema lança a mão do fascismo, porque para o sistema financeiro é importante ter um governo autoritário. Para a grande indústria, para o grande capitalista, é importante ter um sistema autoritário que enquadre a classe trabalhadora, que intimide os sindicatos, que intimide os jovens, as manifestações todas. É quando esse pessoal ganha dinheiro”, aponta.

Para ele, “o Brasil hoje carece de um partido ideológico que trave debates de forma clara, que tenha capacidade de discutir com as pessoas dos mais diversos degraus na natureza de compreensão”. 

“Discutir com a dona de casa, com o desempregado, com o jovem desvalido, discutir com todos os estratos da sociedade, ter capacidade de discutir com as forças produtivas também, com os empresários. E se o velho Brizola estivesse vivo e jovem, faria muito bem. Então, o que falta é um partido ideológico, que promova o debate das questões com seriedade. Isso é o que motiva e inspira os que estão envolvidos nesse projeto”, atesta.

As várias vidas do PTB

O PTB surgiu pela primeira vez em 1945, fundado pelo ex-presidente Getúlio Vargas para, segundo suas palavras, “servir de anteparo entre os sindicatos e os comunistas”. Foi extinto pela ditadura militar, como os demais partidos, pelo Ato Institucional nº 2, em 1965. 

O partido, então, teve uma nova fase após a reforma partidária de 1979, e viveu uma disputa entre Leonel Brizola e Ivete Vargas — sobrinha de Getúlio —, que saiu vencedora e herdou a sigla. Foi a partir daí que Brizola fundou o PDT. Os petebistas se entregaram ao fisiologismo. Com Roberto Jefferson, o partido esteve na linha de frente da defesa dos ideais bolsonaristas e de extrema-direita. Acabou em 2023 depois de se fundir ao Patriota para formar o atual Partido Renovação Democrática (PRD).