Captura do embaixador americano por guerrilheiros que combatiam ditadura militar completa 53 anos neste domingo

Há décadas atrás, nós vencemos e humilhamos o Império norte-americano e aos seus fantochezinhos brasileiros, os ditadores militares do Brasil.

Captura do embaixador americano por guerrilheiros que combatiam ditadura militar completa 53 anos neste domingo

Captura do embaixador americano por guerrilheiros que combatiam ditadura militar completa 53 anos neste domingo

O embaixador americano Charles Burke Elbrick, com curativo na testa, após ser libertado pelos guerrilheiros

04 de setembro de 2022 - 00h07

Há 53 anos…

 

Por Manoel Cyrillo de Oliveira Netto

Há décadas atrás, nós vencemos e humilhamos o Império norte-americano e aos seus fantochezinhos brasileiros, os ditadores militares do Brasil.

Como assim? Há exatos 53 anos, precisamente no dia 4 de setembro de 1969, como parte da luta contra a ditadura, um grupo guerrilheiro brasileiro, capturou o embaixador norte-americano junto à ditadura, o Sr. Charles Burke Elbrick.

E eu tenho a honra de haver participado daquela ação. Fui o seu vice comandante, enquanto o companheiro Virgílio Gomes da Silva (posteriormente assassinado sob tortura pelos ditadores), foi o Comandante de todos nós.

Vocês notaram que eu usei o termo “captura” para me referir à ação? A história oficial, aquela das elites, registra o ocorrido como “sequestro”. Porém sequestro é coisa de bandido, é crime! E, não cometi crime algum! Nós capturamos o embaixador dos nossos inimigos para trocá-lo por companheiros presos pela ditadura. Uma clássica e frequente Troca de Prisioneiros entre países em guerra. Mas, se a Troca de Prisioneiros é frequente, onde está a humilhação dos norte-americanos?

Países em guerra Trocam Prisioneiros, exércitos em guerra Trocam Prisioneiros… naquele caso, um simples comando guerrilheiro estava Trocando Prisioneiros com o mais poderoso país do mundo – algo praticamente inédito, inusitado. E humilhante para o Império. Um vexame para o golpe de 64.

E a proposta de negociação foi imediatamente aceita pelos norte-americanos. Na mesma tarde da captura, ouvimos pelas emissoras de rádio e de televisão, todas elas, a leitura do Manifesto da ação. Comemoramos a vitória, muito! Quem cumpriu uma das exigências, mostrava que estava entrando no jogo, estava negociando. Às partes, bastaria seguir as demais etapas da negociação para que a vitória se concretizasse. Dito e feito, após dois ou três dias, saímos vencedores da ação.

A captura obrigou ao Império a que coagisse os seus títeres brasileiros para que, também eles, aceitassem a proposta da guerrilha. E foi assim que a ditadura liberou todos os companheiros presos por nós exigidos. Todos, os 15.

Os ditadores diziam que no Brasil não havia presos políticos… Fotos e entrevistas com os 15 libertos, veiculadas pelas principais agências noticiosas do mundo, contrariavam aquela história. Pior, todos relatavam torturas sofridas… e a tortura também era negada pela ditadura. Um vexame total, uma vergonha, tanto para o Império, como para a ditadura.

Bem, manifesto lido e companheiros libertados, em segurança, já no exterior, poderíamos soltar o nosso prisioneiro.

Aliás, ao longo de seu cativeiro, na medida do possível ele foi muito bem tratado. Providenciamos, por exemplo, uma medicação diária que ele tomava e que carregava em sua pasta poucas doses – ele nos agradeceu muito pelo gesto. Porém, ao ser libertado, sua foto mostra um “bandeide” em sua testa. O que teria ocorrido?

Imediatamente após tomarmos de assalto o veículo da embaixada, dominando o embaixador e o seu motorista, subimos a encosta do morro por trás da Rua Humaitá, na cidade do Rio. Lá no alto, abandonaríamos o carro oficial, um Cadillac preto, cheio de bandeirinhas, com o nosso manifesto em seu interior e seguiríamos para o nosso aparelho em uma Kombi.

Naquela época, o número de casas naquela região da Zona Sul era mínimo, muito da vegetação nativa do morro ainda estava preservada, havia muita mata. Amedrontado pelo cenário, desesperado, o embaixador agarrou-se às mãos do companheiro Virgílio que, por sua vez, empunhava um revólver. Imaginem, uma situação de extrema emergência! A qualquer momento a arma poderia disparar, atingindo qualquer um.

Para chamar o embaixador à realidade, com a minha arma de mão, dei uma coronhada em sua testa. Funcionou, ele se acalmou, ficou sereno e aceitou a troca de carro. Um ou dois dias depois, acreditem, ele nos pediu desculpas por ter tido aquele comportamento.

No início deste artigo disse que o Sr. Elbrick era o embaixador de um país inimigo. Citarei três ou quatro investidas norte-americanas contra o nosso povo para justificar aquela afirmação.

O golpe de 64 veio sendo gestado por longos e longos anos. Um dos primeiros movimentos que executaram, foi o de incutir na cabeça de nossos oficiais superiores a doutrina gringa de “Segurança Nacional”. Nela, estão preciosidades como o conceito de “inimigo interno” – e quem seria esse inimigo, meu deus do céu?

Ora, o inimigo externo do Brasil era a União Soviética, comunista, xô! E este inimigo seria contido pelas forças armadas norte-americanas. Caberia ao exército brasileiro, combater –no território nacional- agentes do comunismo internacional infiltrados entre o nosso povo, o tal do inimigo interno. Eram traidores da pátria, falsos brasileiros que, sorrateiramente, ingressavam em nossos sindicatos, nas universidades e, inclusive, em nossas instituições políticas para fazer o jogo do Comunismo Internacional, criar confusão, baderna. Chumbo grosso naquela gente!

Com a criação do IPES – Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais, dirigido pelo General Golbery, a administração norte-americana injetou aqui milhões e milhões de dólares em “atividades educacionais” ou, em português claro, promovendo o golpe de estado. Era um grande centro gerador de propaganda, de filmes e de programas de TV anticomunistas. O General Golbery teve que sair do Exército para comandar essa tropa.

Em 64, nas vésperas do golpe, a Quarta Frota da marinha norte-americana foi deslocada para a costa brasileira para dar suporte aos golpistas, caso houvesse resistência ao golpe. Eram muitos navios, muito armamento, muito combustível para os golpistas. Os norte-americanos já liberaram para o público os seus documentos oficiais sobre essa manobra.

Outra grande ajuda que os norte-americanos prestaram aos golpistas do Brasil, foi o treinamento em técnicas de tortura para os militares nos torturarem – lindo!

Foi o embaixador dessa gente que capturamos em 4 de setembro de 1969, há 53 anos…

 

Manoel Cyrillo de Oliveira Netto é publicitário, resistiu à ditadura militar, foi guerrilheiro urbano da ALN (Ação Libertadora Nacional), participou de várias ações armadas, entre elas a da captura do embaixador norte-americano Charles Burke Elbrick. Preso político, permaneceu encarcerado por 10 anos. Fora da prisão, ganhou a medalha de ouro com a peça publicitária Çuikiri no 37th New York Festivals Advertising Awards, o Festival Internacional de Propaganda de Nova York, e foi recebê-la nos Estados Unidos em 1991.